EITA CARTÃOZINHO...

Às vezes, eu fico impressionado como funciona a prestação de serviços no Brasil, especificamente, na relação direitos e deveres dos consumidores. Os Procons de todo o país estão cheios de reclamações contra as empresas, e não se constituem raridades os descasos, até na mídia televisiva, de consumidores que se cansaram de tentar um acordo e não conseguem, de forma alguma, pelo menos, ser atendidos, como foi e está sendo no meu caso.

Eu tenho um ItauCard – cartão de crédito, com vencimento todos os dias quinze de cada mês. Agora no mês de abril, ao receber a fatura, percebi o item anuidade onde lá se encontrava: seis vezes de vinte reais. Achei exorbitante pagar essa taxa para poder utilizar o serviço, mesmo porque, no ano passado, eu já tinha negociado que o cartão seria isento, definitivamente, dessa cobrança. Munido de uma considerável dose de paciência, eu disquei para o zero oitocentos deles. Depois do processo necessário para que uma das atendentes me desse a devida atenção, finalmente me colocaram à disposição da senhorita Jeanne. Expliquei-lhe o motivo da minha ligação e pedi-lhe que revisse as quantias que iriam ser debitadas nas minhas faturas vindouras.

-Senhor, eu estou entendendo a sua explicação, mas o cartão tem um custo operacional e, por isso, o senhor está sendo debitado nesses valores.

-Certo, senhorita, porém eu não tenho nada a ver com o custo operacional do cartão. Sou cliente apenas. Se o cartão não pode me isentar dessa taxa – para que eu o utilize em minhas compras, consequentemente, traga dividendos para o mesmo – eu solicito que a senhorita faça o cancelamento dele, por favor.

- Senhor, o senhor não está entendendo. A anuidade cobrada é para cobrir despesas com atrasos no pagamento, clonagens de cartões, compras indevidas, pagamento de funcionários...

-Senhorita, você me desculpe a pergunta, mas, o que eu tenho a ver com isso? Eu não atraso o pagamento do meu cartão, nunca clonei e nem fiz compras indevidas e, se não me engano, a empresa não honra seus compromissos à custa do suor alheio. Aqui, no caso, a senhorita está querendo colocar a responsabilidade da folha de pagamento da prestadora nas minhas costas.

Nessa altura do campeonato, eu já estava quase zerado com relação ao item calma, mas resolvi ir até o final. E, para não prolongar mais a conversa, solicitei, então, que ela me desse o valor dos débitos – compras do mês, anuidade total, lançamentos futuros, mais um código de barras –, para que eu pudesse efetivar o pagamento dos meus débitos e, ao mesmo tempo, solicitei que ela fizesse o desligamento ou cancelamento da minha conta de cartão junto ao Itaú. Foi aí que começou o maior dos testes: disponibilidade para esperar que a atendente providenciasse uma solução para o meu caso.

Primeiramente, ela me orientou para que não cancelasse o cartão. Em segundo lugar, ela propôs a troca da quantidade de pontos que eu tinha, pela diminuição do valor mensal da anuidade, ficando, no caso, seis de quatro reais. Eu concordei e foram, no mesmo instante, retirados cinco mil pontos dos meus bônus. Como era hora do almoço e já tinham se passado quarenta e cinco minutos, eu achei que a demora seria pouca. O meu estômago implorava para pôr para dentro a comida que estava posta na mesa e que, à medida que o tempo passava, o cheiro delicioso estava indo embora, junto com a minha paciência.

- Um momento, por favor. – repetia a atendente Jeanne a todo o instante. Em seguida, agradecia por eu ter esperado e pedia que eu tivesse mais um pouco de paciência, pois devido a um problema no “sistema” (esse tal de sistema é quem leva a culpa sempre) ainda não tinha conseguido fazer as retificações.

Para encurtar a conversa, depois de vários “aguarde, por favor,” “obrigado por esperar”, “só mais um minutinho, por favor”, “mais um minutinho, por favor”, a gentil senhorita, finalmente, me disse que já estava tudo feito. A partir do mês seguinte, eu pagaria o valor ali acordado e que seria estornado, na fatura seguinte, o que estava sendo cobrado na fatura do mês. Assim, depois de uma hora e quarenta e cinco minutos, eu pude desligar o telefone. O ouvido doía, a fome tinha passado e os batimentos cardíacos estavam, com certeza, nos mesmos níveis dos pilotos de fórmula um.

Dito e feito. No mês seguinte, o estorno, a cobrança da anuidade concordada, tudo nos conformes. Porém, somente no mês de maio, infelizmente. Assim, munido, de novo, de uma dose extra de resignação, de boa fé, que sempre me alimentou, e a certeza de que, desta vez, eu não ficaria mais de uma hora com o aparelho telefônico no ouvido, eu liguei para o ItauCard (eu acho deliciosamente suave a voz que recepciona quem disca para o zero oitocentos deles) e depois de todo o protocolo (que eu acho correto) me atendeu o senhor Leonardo. Coloquei-o, imediatamente, a par do que tinha conversado com a atendente Jeanne – de todo o processo e o porquê de estar ligando de novo.

-Aguarde um momento, por favor. – disse o atendente.

-Pois não. – respondi educadamente.

-Obrigado por aguardar “seu” Raimundo. De fato, aqui consta a sua solicitação, a retificação, tudo está como o senhor descreveu. Acontece... (Neste momento a ligação começou a entrar em parafuso. Era um tal de bip tocando, uma interferência de vozes e barulho de metais batendo um no outro – alternava com o “oi” de ambos os lados até que, enfim, a ligação caiu). Imediatamente, voltei a discar, fiz todo o processo para se chegar ao atendimento com um dos atendentes e, sempre que chegava na opção disque quatro para saber sobre anuidade do cartão, em seguida, caía aquela musiqueta infernal que, das vezes que tentei contato, ela ficou tocando por mais de vinte minutos sem que alguma pessoa me atendesse. Depois de várias tentativas – todas em vão – desisti.

Agora no mês de junho, a anuidade voltou para vinte reais a parcela e, pior, de lá para cá eu não consegui mais falar com um atendente. Mas, eu estou fazendo o seguinte: todos os dias eu ligo para o atendimento ItauCard. Escuto a voz deliciosa de ouvir, faço todos os passos, escuto o meu saldo para pagamento (aí eles são finos em atender!), depois eu espero as opções para o atendimento personalizado e quando chega a opção “quatro” de anuidade eu teclo e fico ouvindo a “musiquinha” irritante, própria para que, quem liga, desligue imediatamente o telefone.

Ah! Tem mais uma coisa: o cartão, apesar de não estar em débito, está bloqueado. Passei um vexame danado, recentemente. Estava em viagem, na cidade de Pau dos Ferros/RN. Fui jantar e, quando veio o valor da conta, claro, dei o meu cartão ItauCard. Para minha surpresa, o pagamento não foi autorizado. De lá para cá, tenho tentado, sem sucesso, inclusive em Postos de Gasolina e Supermercados, utilizá-lo. Porém, em todas as vezes que eu tentei pagar com ele só dá “desautorizado”.

Por sinal, hoje – dia em que estou escrevendo esta crônica, eu cheguei em casa um pouco apressado, pois vinha meio “desarranjado” do intestino e aproveitei, na privada, para fazer a ligação obrigatória de todos os dias – como numa penitência. Como as dores eram muitas, levei um bom tempo – me espremendo e ouvindo a musiqueta – numa sinfonia que, se não ficou uma “obra” de arte, pelo menos fez um duo à altura da consideração que essa empresa tem para com os seus bons clientes.


 

Obs. Imagem da internet
Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 25/07/2010
Reeditado em 07/12/2011
Código do texto: T2399524
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