AVÓS E AVÓS = EC

DIA DA VOVÓ = 1

Eles tinham oito filhos casados. Tinham trabalhado muito e juntos lutaram contra todas as adversidades da vida para cria-los e educa-los até vê-los encaminhados, seguindo seus próprios caminhos, voando com suas próprias asas.

Missão cumprida, os dois viviam agora tão sós quanto estiveram nos primeiros tempos de casamento, aproveitando a mutua companhia, procurando tirar toda ventura possível do tempo que ainda teriam para viver.

Aquele era um dia como qualquer outro.

- Que vamos fazer para o almoço, hoje?

Como sempre acontecia ela consultava o marido.

- Faça um arroz com frango.

E como sempre ela discordava:

- Ah, não! Vou fazer uma macarronada.

Ele deu de ombros, pegou o jornal e os óculos e se dispôs a começar a leitura enquanto ela dirigiu-se à cozinha, separou a metade de um pacote de macarrão e meia latinha de molho para preparar o frugal almoço.

Um alvoroço na rua tranqüila, vários carros parando ao mesmo tempo vozes, risos e barulho de pés correndo na calçada, os levaram a chegar juntos a janela e puxar a cortina para espiar:

- Dia da Vovó! Dia do Vovô! Dia da Vovó! Dia do Vovô!

E a casa foi invadida pelos dezessete netos, alguns já casados com os parceiros e os oito bisnetos.

Abraços, presentes, risos:

- Viemos almoçar com vocês...

- Eu estava começando a preparar uma macarronada...

- Não se preocupe, nós trouxemos tudo.

E de repente houve um rebuliço na casa até pouco antes, tão tranqüila.

As netas mais velhas invadiram a cozinha, acendendo o fogão para acabar de preparar os “quase prontos” que trouxeram, abrindo armários procurando panelas, perguntando onde está isto, onde está aquilo.

A criançada corria de cá pra lá, subindo e descendo a escada (vocês já repararam como as escadas fascinam as crianças?), os jovens ligaram a televisão no máximo de volume para assistir o show de um artista pop.

Os netos mais velhos tentavam conversar com o avô que, aturdido, não conseguia entender o que eles falavam no meio daquele barulho todo.

Minutos depois a mesa estava posta em meio à maior confusão de comidas, bebidas, sobremesas, papinhas de bebês e mamadeiras.

É claro que não havia cadeiras para todos, mas pra que cadeiras se a gente pode muito bem sentar nos degraus da escada?

Depois a foto. Vovô e vovó, sorridentes, rodeados dos queridos netos naquele dia especial. Não faltava nenhum deles o que era difícil de acontecer.

E de novo a agitação, todo mundo colaborando na lavagem da louça, na limpeza do chão, conversando, rindo, chamando as crianças que tinham escapado de casa e estavam brincando na rua, tudo ao mesmo tempo.

Despedidas, abraços, votos de saúde e felicidade e, tão de repente quanto haviam chegado, todos se retiraram, ,entraram nos carros e um a um foram desaparecendo, virando à primeira ou a segunda esquina deixando atrás de si a tarde ensolarada e os velhos avós sozinhos, tão sós quanto estiveram nos primeiros anos de casados.

- Eu não sabia que existia o Dia dos Avós.

- Nem eu. Mas foi uma boa invenção, não acha?

E, então tranquilamente foram ver melhor os presentes, tão felizes quanto uma criança no dia de sua festa de aniversário.

DIA DA VOVÓ = 2

Idalina nunca tivera qualquer comemoração nas datas especiais.

Quando criança, era muito pobre, a família grande e os pais não achavam importante comemorar aniversários ou quaisquer outras datas.

Casada, o marido achava que esses Dias Comemorativos eram uma invenção dos comerciantes, uma exploração, e nunca comemoraram nada.

Agora, viúva, com os filhos longe, morando só, ainda sentia certa tristeza nessas datas.

Um pouco da frustração da infância sem festas nem presentes acompanhou-a pela vida toda.

Dia dos namorados, das mães, das avós, tudo passou sempre em branco e agora, velhinha e só, ainda sentia falta de um carinho no Dia dos Avós.

Estava rememorando todas suas mágoas, dizendo a si mesma, sem se convencer, que isso era bobagem, quando bateram a sua porta.

Abriu e lá estava uma meninazinha que morava na vizinhança com uma folha de papel na mão.

- Dona Idalina, eu fiz um desenho na escola para dar à minha avó e como me lembrei de que a senhora não tem netos, fiz um para a senhora também.

Emocionada Idalina pegou o papel meio amassado onde havia um grande coração desenhado, meio torto e com letras inseguras a mensagem “Vovó! Você mora no meu coração”

- Posso dar-lhe um abraço?

E pela primeira vez na vida, aos oitenta anos a Idalina teve a sua homenagem.

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Este texto faz parte do Exercício Criativo - Dia dos Avós

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Maith
Enviado por Maith em 26/07/2010
Reeditado em 26/07/2010
Código do texto: T2400146