- ARRUMA UM NAMORADO !

Certa jovem, a quem não tivera o prazer de ser apresentado, acercando-se de mim declarou-se leitora habitual destas crônicas; e por julgar me conhecer - melhor do que eu a mim mesmo -, dizia-se na obrigação de me dar alguns ‘toques’, pois em sua opinião, talvez involuntariamente, ao escrever demonstro ter o ego maior que estes horríveis espigões, que escondem a nossa bela Igreja Matriz.

Contendo o riso, expliquei-lhe que ao redigir na primeira pessoa do singular, não significa que seja eu o protagonista da estória; ou que esteja promovendo minha apagada imagem, querendo aparecer... A ideia é que alguém, eventualmente lendo estas patacoadas, se coloque como narrador, participando da tramóia! Uma testemunha ocular, que mesmo não havendo presenciado os fatos faça deles uma descrição pormenorizada, até cúmplice. Arrematadas mentiras passariam como verdades inquestionáveis. Sinceramente? Apenas um recurso a mais de que se valem escritores medíocres, ou de talentos escassos, como o fulaninho que assina esta página.

Não satisfeita, a mocinha acentuou que a partir de agora se sentia traumatizada, ante a figura - pouco cativante - deste visionário. Confidenciou-me ela que, nas leituras das minhas xaropadas, gostava de fantasiar que seu autor seria um homem alto, moreno, cabelos ligeiramente grisalhos... Quanta decepção! À sua frente não havia ninguém mais que um sujeitinho miúdo, míope, magrelo... Alguém que, se vestido com roupa xadrez, e chapéu de palha na cabeça, ao lusco-fusco seria facilmente tomado por espantalho de horta! Concluiu irremediavelmente desiludida, a esta altura, minha ex-leitora. Por este aspecto há que se lhe conceder razão: a Natureza não foi muito boazinha comigo!

Embora não seja hábito meu prevalecer em tais circunstâncias - como de resto em outras muitas -, mostrando rompante, também não tenho sangue de barata. Extraodinariamente fora dos meus modos, disse-lhe: - Já pensou se, por descuido, a Natureza colocasse o meu cérebro dentro da embalagem que você sugeriu? - Convencido! Você se acha o Dez! Mas ao vivo não está com nada! Esbravejou a garota trincando os dentes. - Aí, estamos de acordo. Repliquei para espanto dela e meu. Realmente, não sou fotogênico, tenho papo ruim, e nem piada sei contar. Mas bom humor não me falta. E busco extraí-lo das situações menos convencionais. De preferência rindo quando a ‘vítima’ da palhaçada sou eu. Só está habilitado a rir dos outros, quem primeiro ri de si mesmo!

Antes que ‘elazinha’ dobrasse a esquina, ainda sem atinar direito com as palavras, em tom de galhofa, recomendei-lhe: - Arruma um namorado! Por respeito à memória da senhora minha mãe, e à requintada educação das minhas honoráveis leitoras recantistas, não ouso descrever aqui o gesto com o dedo, nem o nome do lugar para onde aquela desbocada mandou que eu fosse me enfiar! Como visto, é lógico que não fui. Preferi escrevinhar mais esta crônica de final de domingo.

dilermando cardoso
Enviado por dilermando cardoso em 01/08/2010
Reeditado em 01/08/2010
Código do texto: T2412401