Crônica I: Estou chegando

Estou chegando

Ana Esther

Querido leitor, como esta é a minha crônica inicial resolvo começar pelo começo: a minha chegada em Florianópolis. Era o ano de 1939, o navio atracou no cais próximo ao Mercado público na capital dos catarinenses, grandes expectativas... Epa, desculpem-me. Essas são as memórias de viagem da minha mãe. Eu já não tive esta sorte, cheguei em Florianópolis pela primeira vez de ônibus mesmo. Tudo bem que há também um toque nostálgico na minha história pois a Rodoviária era a velha, na Av. Hercílio Luz...

Minha mãe e eu viemos passar as férias de julho (outro arcaísmo) na bela ilha de Santa Catarina. Gaúchas que somos, viemos de mala e cuia. Como vocês já sabem minha mãe esteve pela primeira vez na ilha na década de trinta e jurou a si própria que viria morar aqui. Bem, era metade da década de setenta e ela ainda não realizara seu sonho. Esta era mais uma tentativa.

Infelizmente eu ainda não havia me tornado a Mochileira Tupiniquim. Cheguei a Floripa determinada a não gostar do local. Confesso que isto exigiu de mim forças, e criatividade, inimagináveis. Explico. Eu, uma adolescente meio típica, estava na época apaixonadíssima por um ‘guri’ de Porto Alegre e não de Floripa, agora dá para entender? Assim, além de frustrar mais uma investida de minha mãe em se transferir para cá, tratei de nem reparar na beleza das praias cantadas mundo a fora. Olhei a Ponte Hercílio Luz como sendo uma mera ligação entre ponto A e B. A arquitetura dos prédios antigos então, uma ‘velharia’ só! O Mercado Público, bem que cidade não tem um? A Figueira da Praça XV, credo uma árvore com cem anos, de repente vai cair em cima da gente. E o Museu Cruz e Souza... admiti ter adorado ver a primeira lâmpada do Estado. Mas também ninguém se muda para uma cidade devido a uma lâmpada no seu museu. E a Rua Felipe Schmidt –ah, igual à Rua da Praia em Porto Alegre.

Oh, adolescência... O leitor catarinense já deve estar se mordendo. Mas não precisa, pois a adolescente cresceu, a paixonite passou, foi mordida pelo vírus dos viajantes... E cá estou eu agora, orgulhosa neo-manezinha, morando em Florianópolis há um tempão. Sem precisar fingir que nada me encanta. Minha mãe? Ela estava certa, seu destino era mesmo morar naquele porto que ela, de coração aberto, amou desde que desembarcou do navio em 1939.

*Escrevi esta crônica em 11/7/2007.