Primeiro Beijo

Vontade não, o que faltava mesmo era oportunidade! E esta surgiu quando menos esperavam. A semana estava no meio e os encontros nesse horário eram raros, por que enquanto ele estudava pela manhã ela estudava à tarde, e ainda por cima, em escolas diferentes. Mas nesse dia, como se planejado, ele havia faltado à aula e desde cedo tinha ido para a casa dela que ficava na esquina de sua rua.

O menino só tinha 13 anos. Sempre tinha sido um garoto tímido em matéria de amor e, mesmo tendo se apaixonado várias vezes desde os seus sete anos, nunca havia beijado de verdade, a não ser alguns poucos selinhos que ganhava graças as brincadeiras dos colegas, como verdade e desafio, onde existia as opções: ou encara a pergunta – sempre indiscreta – ou se dispõe a pagar a chamada prenda, que normalmente eram beijos inocentes que alvoroçavam toda a turma.

A menina, um pouco mais nova, ainda ia fazer 12 anos, já era mais experiente nessa área. Tivera uns dois namorados anteriores e alguns ficantes, além de, por causa da beleza, despertar o desejo em muito outros garotos, tanto do bairro, quanto da escola. Mas também era tímida e muito meiga. Tinha um irmão menor, que ficava sempre com ela em casa e era o ponto chave desse relacionamento.

Foi através do irmão que ele conseguiu chegar a conhecê-la. Já tinha notado-a na rua, seguia-lhe incessantemente com os olhos e nunca houvera motivo que o levasse a conversar com ela, mesmo morando na mesma quadra. Certo dia, devido ao vício do vídeo game, conheceu o único irmão que ela tinha. Era um garoto esperto, com seus quase dez anos de idade e toda disposição de criança, o atalho perfeito para se aproximar. No entanto ele gostava do menino, brincavam horas a viu e diferença de idade não os impediam de gostar das mesmas coisas.

A partir daí, ir a casa dela não era mais o problema. O problema era não poder entrar e ter que contentar-se em dividir a janela com ela e o irmão, o pequeno amigo, por causa da ausência da mãe que trabalhava todo o dia e estudava a noite e sempre deixava a ordem expressa de não permitir ninguém de entrar em casa quando não estivesse. Mesmo assim, iniciou o esquema da paquera. Diariamente estava na janela, ora brincando com o irmão enquanto ela cuidava da casa, ora conversando com os dois ao mesmo tempo e raramente aproveitando momentos a sós com ela.

Mas, como diz o ditado, tudo chega pra quem sabe esperar. Sua presença constante na janela da casa, até mesmo quando a mãe estava presente, despertou nela certa confiança. A mãe passou a observar a amizade entre os três, percebeu o quanto seu filho se divertia junto àquele menino e o quanto este respeitava sua filha. Tanta conversa fez com que a mãe conhecesse pouco mais sobre ele: estudava, trabalhava e não se envolvia com os adolescentes perdidos do bairro. Não bastasse isso, era inteligente. Tanto que a ajudou a resolver várias questões de uma atividade escolar. Isso foi a solução. Quando apontou no outro dia na esquina percebeu no sorriso escancarado da menina que algo bom acontecera. A mão havia permitido a entrada dele em casa, mas deixado a ordem: só dele!

Não precisava de mais ninguém. Dentro da casa agora era fácil a paquera se concretizar. Não tão fácil, ainda tinha o irmão, ele nunca poderia saber do namorico dos dois, seria o fim de tudo antes mesmo de começar.

O tempo foi passando e as oportunidades surgindo. A paixão inocente de ambos os jovens se tornava cada vez mais puramente avassaladora. Até que chegou naquele dia.

Já estava dentro da casa, brincou um pouco de vídeo game com o, já chamado pelas costas de cunhado, e depois passou a assistir os desenhos matinais. Ela cuidava da casa como todos os dias. Algum tempo mais tarde, deixou o pequeno amigo na sala assistindo seu desenho preferido e foi até a cozinha ajudar no dever da garota enquanto ela preparava o almoço. Na mesa, sentou em uma cadeira mais próxima ao fogão. A conversa revezava: alguns instantes, para disfarçar, o assunto era matemática, nesses momentos falava alto para que o irmão ouvisse de onde estava; outros instantes despencava o tom de voz e falavam sobre eles de forma mais íntima.

Depois de muitos sussurros e risos tímidos ele levantou-se. Aproximou do fogão e ficou de frente para ela. Embora ele fosse baixo em comparação com os outros garotos de sua idade, era mais alto do que ela e na pouca distância em que estavam dava para ele a encarar de cima como um verdadeiro homem que sabe o que quer. Foi o que fez. Encarou-a e riu. Um misto de inexperiência e descoberta movia dentro dele, esquivando-se das atitudes ingênuas que poderiam denunciá-lo como o novato que realmente era, ele forjava olhares maliciosos e amaciava a voz tentando demonstrar que aquele era o natural, não sabendo ele que para todos os homens que já passaram por isso falar daquele jeito realmente era natural.

- O que você ta fazendo?

Ela riu ante a pergunta. Baixou os olhos, balançou a cabeça e se permitiu ser admirada novamente.

- Eu? To fazendo arroz.

- Ah é? E como faz? Você me ensina?

Ele não entendeu bem por que perguntou aquilo, mas tinha convicção que estava no caminho certo.

- Claro! Mas pra quê você vai querer aprender isso? – Indagou sem dificuldade de exibir uma sensualidade na voz.

- A gente precisa saber de tudo um pouco. – Ele se aproximou ainda mais e passou um dos braços por entre a cintura dela puxando-a levemente para si.

- Menino, olha o que você vai fazer...

Ela sempre o chamava daquele jeito e ele amava. Menino. Ele ouvia e ao mesmo tempo ria dentro de si, achava tão carinhoso que tinha vontade de abraçá-la sempre quando ouvia.

- Só vou aprender.

Os dois falavam bem próximos, era uma cena perfeita. Linda, pelo romance surgindo, e pura, pela inocência daqueles corações.

- Primeiro você prepara o tempero, esquentando o alho com um pouco de óleo, depois acrescenta - ele se achegava lentamente, olhando fundos nos olhos miúdos e negros e vendo apenas o mover pálido dos lábios faceiros e não ouvindo deles palavras nenhuma – o arroz deixando-o... – ela tocou-lhe o rosto – menino, você quer experimentar? – a voz quase inaudível, com se ela já não fosse necessária, os olhos haviam assumido aquela função.

- Seria minha primeira vez! – Envolveu-a com o outro braço desenhando nas suas costas um x, deixando claro, a si mesmo, que aquela era a opção correta.

- Não tente me enganar, menino.

- Estou falando muito sério.

- E o meu irmão? – Perguntou ela meio assustada.

- Não tem nada no mundo que o tire da frente da televisão nesse momento.

Ela baixou o rosto e ele brandamente suspendeu-lhe o queixo. O olhar lépido de ambos encontrara-se novamente. A garota prosseguiu sua receita vendo o outro rosto se aproximar:

- Deixa o arroz dourar um pouco, - o rosto dele ainda mais perto e ainda se achegando – coloca a – sentiu os lábios tocarem os seus, deixou-os unidos por alguns instantes e afastaram-se alguns milímetros somente para ela completar – a água.

Admirou-a naquela fração de segundo.

- E pronto. – Suspirou ele e a viu fechar os olhos e se entregar nos seus braços. Beijaram-se.

Tiago Mota
Enviado por Tiago Mota em 25/08/2010
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