DIREITA, VOLVER !

Fala sério. Agora que você já é um tranquilo aposentado, ao olhar para trás, vai dizer que em certo momento da vida não deu mancada, e se ainda houvesse algum modo de corrigir - a famosa segunda chance -, não faria de outro modo? Com o Zé da Silva aqui não foi diferente; faltando-me procurações para recontar histórias alheias e, sobretudo, pela carência de modéstia, narro mais um capítulo da minha vida rocambolesca, que a bem poucos deve interessar. Mas, quem saia à chuva...

Como era comum naqueles anos (década 1970), metade mais cinquenta por cento dos rapazes oriundos da chamada classe-média-baixa sonhavam fazer carreira militar. Em Bom Despacho está instalado o Sétimo Batalhão de Polícia de Minas Gerais. Não fui exceção. Ao olhar pelo retrovisor da vida, sendo excluído por não atender as exigências físicas (sempre pareci um refugiado desnutrido, destes países que vivem guerreando), e psicológicas (de perto ninguém é normal), reconheço que ganhei muito e a Polícia Militar, ainda mais!

Pra início de conversa cismei fazer o C.F.O. (Curso para Formação de Oficiais); não me contentava em ser soldado raso: rastejar na lama ou na poeira, subir morro de favela atrás de traficante e bandido, dar tiros. Eu queria galões, divisas no ombro! Se você me acha metido a besta - desculpe -, o masoquista não sou eu. Em vão insisti. De nada valeram minhas experiências no Tiro-de-Guerra, que concluí por camaradagem do sargento, sem aprender ao menos desmontar um fuzil. Eu nada tinha a ver com aquilo. Na hora da ordem unida, ao comando de volver à direita, lá ia eu para a esquerda. Alto! Continuava marchando. Cantando o Hino Nacional misturava sua letra com a do Hino à Bandeira. A despeito de tudo, quis ser oficial militar!

Atrás de uma ‘ideologia’ (porque à época todo mundo precisava ter uma!), fui para Belo Horizonte e me enturmei com uns caras contestadores do Golpe Militar de 1964 - (hoje, Patrus Ananias é Ministro de Governo; Fernando Pimentel, Prefeito da Capital; enquanto o “Chico” meu codinome e apelido para macaco de circo, escreve crônicas! Devido, outra vez, à minha falta de vigor físico, cabia-me distribuir panfletos subversivos nas portas dos cinemas de BH, correndo e apanhando da polícia militar. Ironia do destino!

Tais lembranças me afloraram à memória, depois que o cabo Paulo me contou sua agonia, numa ocorrência cumprida nas imediações da Rua do Calabouço (a cidade tem outros nomes só dela: Rua do Céu, Praça Jardim-sem-flor, Bairro do Quenta-sol). É comum policiais militares fazer até partos nas viaturas; mas aquela chamada também era urgente: resgatar uma cadelinha que caíra numa fossa de privada, antes cisterna, daí profunda! Amarrado numa corda, descia ele buraco abaixo, maldizendo a vida: - Se esta desgraça arrebentar é que estarei, de verdade, na merda!

Por sorte e competência a cachorrinha foi resgatada dentro de um balde plástico, e o final da operação festejado com uma rodada de Q-suco gelado. Então, uma vizinha da casa, enfiando a cabeça na abertua da cerca, provocou: - Já que você vai passar o resto do dia passeando na viatura, antes, vem aqui em casa e troca o botijão de gás, pra mim! O cabo Paulo correu-lhe um olhar 43, aquele assim, meio de lado, indo embora, e... foi!

dilermando cardoso
Enviado por dilermando cardoso em 29/08/2010
Reeditado em 04/12/2010
Código do texto: T2467078