Cheiro de paraíso

Sábado de manhã. Levantando meio torta da cama, parecendo carro batido depois das aulas da semana inteira, nada melhor do que sair de casa, inventar um passeio, principalmente num dia de sol. E vamos nós...

Vale tudo: um almoço em Santo Amaro da Imperatriz, no entorno de Florianópolis, e depois ir à fonte da melhor água mineral do mundo numa localidade chamada Águas Mornas. Tudo cheira a poesia em Santa Catarina! Terra de trabalho, de imigrantes, de força e de saudades. Santa Catarina faz a alma brilhar, se deslumbrar. Existe, no caminho, em qualquer caminho, uma plantação. Em estradas vicinais, é comum uma parada para a oração numa das tantas grutas espalhadas pelo Estado. Tempos dos imigrantes, da falta de padres, do ter que enfrentar longas distâncias e de dificuldades em construir igrejas... mas sempre Santa Catarina...

E vivendo essa atmosfera do trabalho imigrante, suado, intenso, saímos praticamente todos os finais de semana. Simplesmente para contemplar.

Não tem coisa melhor do que enfrentar com entusiasmo um bom churrasco numa localidade chamada Tijucas, mas aquele bom mesmo, simples, de beira de estrada, com um bufê sortido e o frango assado nos esperando... De sobremesa, salada de frutas e algum creme de baunilha, de morango ou de coco. Tudo uma delícia. Depois é só chegar ao município de Tijucas mesmo, e olhar para o rio que banha a região, largo e de bons amigos. Me lembra muito o rio Ribeira, que banha a região sul do Estado de São Paulo, com toda a sua suavidade, mansidão e poesia e as plantações da chá e de banana.

Mas Tijucas tem uma história belíssima, de muito trabalho, sonhos e crença em bruxas, muitas bruxas! Fundada em 1860, os açorianos recém-chegados trataram de sobreviver graças à pesca e à agricultura. Com muita freqüência, as ilhas do Arquipélago dos Açores sofriam abalos sísmicos terrestres ou submarinos. Tal situação se agravava com a escassez de alimentos e acabou provocando a saída de parte de sua população, estimulada pelo rei de Portugal, em direção ao sul do Brasil. A idéia era, em pleno século XIX, branquear o país. Deixar a língua portuguesa marcar presença. Os açorianos trouxeram o trabalho, uma tentativa de sobrevivência que tem que ser resgatada com a máxima freqüência e intensidade.

As festas religiosas, como a Festa do Divino, retratam a religiosidade. E tem um misto de artesanato, de olaria, de sabedoria, com a valorização do mar e dos seus frutos, o conhecimento das coisas da natureza, o entendimento das mudanças da cor do mar, a certeza se vai ou não chover amanhã conforme o tipo de nuvem, os tipos de alimentos com as tradições e memórias e tudo isso encharcado de cultura e de sentimento.

E Tijucas é assim. Como são outros tantos municípios e regiões da grande Florianópolis.

O rio que banha a cidade traz a marca dos que tentaram erguer uma cidade, retirando dali parte da sobrevivência.

E caminhamos, olhamos, sentimos e nos sabemos vivos à margem da sabedoria deixada por todos os antepassados.

E a cidade segue calma, bonita e mansa. Tijucas tem cheiro de caminho. Caminho de sábado depois do sol, esperando a primavera, caminho de paz.

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 02/09/2010
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