FICAR...

“Ficar” passou a ser um verbo muito utilizado nos relacionamentos relâmpago, que se usa ultimamente. É seqüestro relâmpago, amor relâmpago e, para mim, trabalho relâmpago.

Como não sei aturar desaforo, acabo ficando pouco tempo em cada trabalho. Mas vejam se eu não tenho razão.

Eu trabalhava numa livraria, onde estava muito feliz porque podia ler de graça, quando recebi um telefonema.

Um homem muito mal-humorado, com a voz de uma pessoa idosa e surda, suponho, já que ele gritava ao telefone.

- Olha aqui, minha filha, eu não estou disposto a ficar até o fim do mês esperando pelo livro que encomendei não, entendeu?

- Pois não, meu senhor, qual foi o livro que o senhor encomendou?

- “Estrepolias sob os lençóis”

- Quando foi que o senhor o encomendou?

- Ontem à tarde.

- E o senhor já quer que o livro esteja em suas mãos? Nós temos um prazo de entrega.

- Por que vocês não mandam por sedex?

- Porque é mais caro e o senhor, pelo que eu vejo aqui na sua ficha, não autorizou a entrega urgente.

- Vocês são ricos, vendem pra caramba e ficam economizando no envio?

A minha paciência já estava chegando ao fim, não pelas reivindicações do homem, mas pela maneira como ele gritava no meu ouvido.

- Meu amigo, eu vou providenciar para que a entrega chegue o mais rápido possível.

- Será que essa porra vai chegar antes de eu morrer?

- Meu caro senhor, não sei se a providência divina vai chamá-lo por esses dias, pode ser que o sistema deles esteja fora do ar e o senhor ainda tenha que penar um pouco nesse planeta, mas não se preocupe, eu vou mandar dois exemplares: um para a sua residência e outro para o inferno, para onde, naturalmente, o senhor vai. Se não tiver vaga lá, pode ser que o mandem para a p q p.

- A senhora é muito mal criada e é melhor que vá à merda, antes que eu me esqueça.

- Vou sim, mas o senhor fez reserva? Ouvi dizer que lá está muito cheio com toda a sua família.

Nesse momento o gerente vinha passando, ouviu a conversa e me despediu.

O cliente tem sempre razão - disse ele - seja ele estúpido, mal-humorado, meio louco, esquizofrênico ou paranóico. São eles que nos sustentam e a senhora está despedida, dona Vitória Eugênia.

Bom, estou sem emprego, mas garanto que não vou ter um enfarto por aturar desaforo de ninguém.

Edina Bravo

edina bravo
Enviado por edina bravo em 30/09/2010
Reeditado em 29/05/2013
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