FAMILINHAS

(veja este texto com imagens em http://cronicasdobeto.blogspot.com/2010/10/familinhas.html)

A sua cidade já foi acometida por uma moda esdrúxula, que até pode ter começado por uma iniciativa criativa, mas que com o passar do tempo tornou-se (por obviamente ser em essência) extremamente brega? Pois aqui em Curitiba (terra do frio, do céu cinza, das pessoas que não dizem “Oi” no elevador, das mulheres que negam um convite para dançar e do Beto) isso vira-e-mexe acontece.

Já vivenciamos, por exemplo – quer dizer, as meninas dessas paragens vivenciaram – a moda dos topetes. Aliás, nós, homens, acabamos participando indiretamente de tal bizarraria na época, pois precisávamos conviver com aquelas conchas acústicas capilares ambulantes à la Itamar Franco. Faz tempo que isso aconteceu, mais ou menos no mesmo período em que, como diria José Simão, o Plínio de Arruda Sampaio cedeu sua costela para que Deus fizesse Adão.

Funcionava assim: quanto maior o topete, mais “sensual” era a ragazza. Ou seja, a modelagem da franja tinha um quê de dança do acasalamento do pavão, só que com a fêmea abrindo a cauda... na testa. Eu tinha uma vizinha (não adianta, não revelo o nome nem se a Dilma for a torturadora) que era praticamente a Miss Topete Curitiba. Se ela pegava geral por conta do artifício? Respondo com outra pergunta: quer saber em quantidade ou qualidade?

Bom, voltando à moda – antes que eu me complique ainda mais com a vizinhança – e ao motivo desta crônica, atualmente há outra febre na cidade: são os adesivos para carro que representam “familinhas”. Explico, caso o leitor não seja daqui, pois os daqui sabem, garanto, perfeitamente do que estou falando. Alguém, um belo dia, teve a brilhante idéia de colar na lataria de seu veículo adesivos com figuras (também chamadas no meio virtual de “avatares”) que representavam a sua família. Normalmente tem a mamãe, o papai, e os filhinhos. O gênio (ou “gênia”... já que podemos falar presidenta, me dou o direito) achou que a idéia seria criativa, divertida e daria um ar de personalidade ao seu bólido. Mal sabia ele que estava criando um mostro.

Pois atualmente, de cada dois carros dessa cidade (e olha que ela tem carro pra cacete) um tem a porra do adesivo de “familinha”. É o troço mais jacu (perdoem-me os de fora se essa gíria não lhes faz sentido) do mundo. O pior é que agora, como tem “familinha” demais por aí e ninguém quer imitar ninguém (hahaha), os “curitibocas” decidiram “inovar”, ser “diferentes”. Portanto, os avatares não são mais só dos membros inequívocos da família, mas também foram incorporados aos personagens adjacentes.

Então, tem familinha posando ao lado do cachorro, com o papagaio, gato, periquito, peixinho, sogra, ricardão escondido dentro do armário, vizinho pentelho, primo distante, duende, estrela-do-mar, jacaré do Parque Barigui, Rafael Greca pedindo voto, secretária gostosa, Professor Galdino de bicicleta, Oil Man de sunga, Velha da Borboleta 13 e por aí afora.

Pior, os avatares dos próprios membros precisaram ser incrementados. Então, há os com vestes de noivos, os que ostentam varas de pescar, os punks, os com skates, os com roupas típicas polonesas, os com roupas típicas ucranianas, os de quimono, os padres, os médicos, os felizes, os emburrados, os advogados, os advogados, os advogad... (é que tem advogado às pencas nesta terra), etc., etc., etc.

Neste fim de semana eu vi, colado na traseira de um Pálio, um adesivo em que toda essa caterva de gente, com bichos e penduricalhos a tiracolo, estava entrouxada dentro duma Kombi. Daí eu pensei, “mas, que diabos, o carro não era para ser uma Kombi? Ou, melhor, o adesivo não devia ser um Pálio cheio de gente?”, e me confundi todo no que diz respeito à representatividade fidedigna, e se isso importa no fim das contas, dos avatares.

Aliás, falando em ser fidedigno, um amigo meu disse que vai colar um avatarzinho (de óculos) dele com um “harém” de mulheres em volta. Só se for para servir de simpatia, para ver se atrai o que não tem; respondi a ele.

Mas o que importa, na verdade, não é o fato de alguém colar um adesivo em seu carro, mas, sim, o porquê de fazê-lo. Afinal, é um modismo besta que, tal e qual os adesivos de mancha de tinta ou de furo de bala, que eram de um ridículo ímpar, e que também já se enfurnaram tempos atrás na mente dos cidadãos curitibanos, logo-logo sairá de moda... e aqui é que mora o problema e o fato de eu ter me dado ao trabalho de perder meu tempo falando disso: por que, raios, as pessoas precisam sempre copiar as outras, ainda mais em algo tão inútil? Resposta: não faço a menor idéia.