Renatinha meu amor.

Cartas do psicoclaustro

Renatinha meu amor.

No quarto ao lado ao meu descobri Renatinha. Meio anjo, meio fada, meio moça. Nem sei por que eu a amava tanto. Seria pela fé com que tocava minha cabeça e dizia:

- Você me perdoa, minha neta?

Ouvindo uma resposta positiva emplacava outra pergunta:

- Posso orar por você? – Que o Senhor Jesus te abençoe e te guarde e que mantenha toda sua família bem.

Às vezes aparecia dizendo:

- Sai daqui agora!

Ou:

- Que palhaçada! Para alguém invisível que ela via no nada.

Sempre sentia muita falta de minhas meninas no psicoclautro. Mas reparei que quando Renatinha aparecia a dor da falta das minhas meninas diminuia.

Depois de um tratamento estranho, com nome bonito e a base de choque elétrico, Renatinha passou a sorrir mais e a dizer períodos inteiros. Amei-a mais ainda.

Um dia na fila de remédio sentei-a em meu colo e ensinei, como havia feito com minhas filhas a muito, que ser feliz era uma escolha.

Não sei se ela aprendeu, mas deu belas risadas.

Tinha o habito de referir-se a si mesma como Nanata. Sussurrava o tempo todo:

- Nanata, não derrame o café!

- Nanata, coma todo o pão!

Era o superego mais vistoso que eu já conheci.

Passei a participar dessas conversas consigo mesma quando entendi a dinâmica. Derramei o leite durante o café da manhã e emendei:

- Falei que não era para entornar o leite, Nanata!

E ela, de cara, respondeu:

- Entornou, vai ter que enxugar. Tá, Nanata!

Olhando firmemente para mim e sorrindo.

Esse sorriso encheu aquele meu dia e trago-o comigo até hoje, três anos depois de deixar o psicoclaustro.

Norma de Souza Lopes