O VIZINHO ALADO, AO LADO


As férias se acabaram e os vizinhos, que moram ao lado, voltaram, para a minha tristeza e desespero. Com eles trouxeram o papagaio de estimação, que já faz parte da comunidade.
Todos os dias ele me acorda com seus gritos estridentes. Assovia, grita e, com sua voz esganiçada, grita meu nome: Mariiiiiiiiiiiiiiia, acorda pra trabalhar, Maria!
Pobre bicho! Não entendo o que faz um ser humano prender uma ave de grandes asas, nun pequeno quadrado, atado a uma corrente. Ele que tem asas para voar não pode se conformar de viver em Ipanema, ouvindo barulho de carros e motos. Quando passa o carro de bombeiro ou da polícia, com as sirenes ligadas, ele parece ficar ainda mais nervoso. Se joga de cabeça para baixo e fica pendurado pelo pé, numa atitude suicida.
Talvez, bem mais atordoantes do que as sirenes, sejam os gritos da vizinha o que mais deve atormentá-lo, não só a ele, mas ao marido, aos filhos e aos vizinhos. Ela blasfema o dia todo, xinga os filhos desde as primeiras horas do dia e roga pragas no marido, um homem já bastante idoso para ser o pai daqueles diabretes. Ele parece não se incomodar. Da minha janela o vejo com o fone nos ouvidos, talvez embalado por alguma canção romântica, longe dos gritos da mulher. Mas e o papagaio, como fica nessa história? Ele não tem um I-phone e não pode fugir da sua prisão.
Todos os dias o olho pela manhã, na esperança de, um dia, vê-lo tapando os ouvidos com as asas. Enquanto ele não consegue essa façanha, vai gritando para encobrir os gritos da vizinha ou, talvez, para mostrar seu desespero.

edina bravo
Enviado por edina bravo em 14/11/2010
Reeditado em 29/05/2013
Código do texto: T2615275
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