O VELHO URBANO
Aproximadamente 65 anos, alto, rechochundo, barba por fazer e uma imensa loucura no olhar. Em sua roupa, velha e parda, estam impregnados gás carbônico e poeira de asfalto. Suas mãos sujas clamam por ajuda:
- Me dá uma esmola aí, moço!
Em um dado momento, seu olhar se fixa na fila de carros parados no sinal. Em seguida, ele dá uma gargalhada insana, como quem diz:
- Tenho pena de vocês também!
Eu estou nesta fila de carros parada e fixada pelo olhar do ancião. Neste momento, sou um objeto ilusório, parte da loucura de um louco.
O sinal abriu. Sigo meu trajeto até o trabalho impregnado pelo olhar daquele senhor. Tento pensar em sua história, em suas conquistas e derrotas, nos momentos de alegria... Na primeira vez em que se apaixonou. Escolho uma fila de carros também pra fixar meu olhar. Olho para o lado e vejo uma senhora se maquiando enquanto a fila não anda. Pelo retrovisor interno observo o casal do carro de trás discutido, cheio de ódio nos olhos. Imagino-me como o Velho insano:
- São todos loucos ou enlouqueci?
E, de uma forma brusca, saio do meu transe, auxiliado pela batida de uma Velha senhora no vidro do meu carro. Leio em seus olhos: eu faço parte da história daquele senhor de roupa parda exalando poeira de asfalto! Olho ao meu redor e observo que todos os outros carros se foram. Entrego algumas moedas para a Velha e sigo meu caminho. Agora estou como os outros em seus carros, de olhos fechados para os vislumbres da normalidade urbana.