SANGRANDO A INJUSTIÇA

Não te encontro em canto algum Gwen. Eu aqui, mergulhada nesse rio de lágrimas, mais uma vez fugindo do convívio laborativo, e você no trottoir anônimo de lagartixa. Você não está aqui para me dizer que fiz a escolha certa e eu estou indisposta para a vida. Já fiz esse caminho e tinha escolhido viver. Agora o desejo é outro.

Não estou certa se minha transparência seja a reação mais adequadada a esses tantos outros que me cercam. Hoje a dor me engoliu e eu fui até eles, revelei inteira a minha raiva e decepção, meu medo e minha gana por adequação, rasguei minha alma e mais uma vez me vi andrajosa aos olhos do mundo.

Já sei que no futuro irei me arrepender das revelações. De que vale colocar minha conciência sobre a mesa como visceras de um pássaro morto no cárcere? Os outros continuam máscaras. Ninguém se revela. Estou sozinha nessa cena.

Depois de saciar a sede de fracasso que me ronda o que vejo são seres apavorados de medo diante de minha alma desnuda. Tenho contrangido meus adversários e afligido meus amigos. Esses segundos me querem forte e falsa. Justo o que não quero ser.

Se você estivesse aqui Gwenever, me diria que gozo essa dor quando não a abandono. Teria errado na fala. A injustiça, essa adaga afiada traspassada na carne, não pode ser arrancada por mim mesma. E o outro, que poderia arrancá-la admitindo o erro ou devolvendo-me o direito, apenas contrói alegações de autodefesa. Isso quando não me acusa publicamente. A dor que sinto depois disso é real. Não vejo humildade. Também não consigo ser humilde. Choro lágrimas orgulhosas e ressentidas e fujo mais uma vez. Agora vou dormir. Felizmente estou sozinha e ninguém irá assistir a tragicomédia de minhas digressões narcisicas.

Vê se aparece amanhã, Gwenever, sem você minha alma réptil degringola.

Norma de Souza Lopes