O caminho mais curto

Três horas da manhã. O despertador tocou. O avião nos esperava em Campinas.

Dois dias antes minha sogra havia ligado nos intimando a comparecer em Blumenau para o juramento que garantia o passaporte italiano para todos os membros da família.

Depois de um final-de-semana regado a queijos e vinhos eu me enfastiava só de pensar em pegar os 800 longos quilômetros que nos separavam de Blumenau.

Depois de muito pensar chegamos ao brilhante plano: desceríamos de avião até Curitiba e dali, ele seguiria até Blumenau, a cento e tantos quilômetros, enquanto eu esperava na casa de nossos compadres.

Desligamos o despertador e seguimos para Viracopos, em Campinas. O vôo estava programado para 6:05 da manhã chegando em Curitiba 7:05 da mesma manhã. Um presente dos céus para quem já se acostumara a horas de estrada até nossos destinos. Assim, nos dirigimos ao portão de embarque as seis e tanto, com o vôo já atrasado.

A aeronave era pequena, pequena demais para alguém como eu que bambeia de estar a mais de dois metros do chão. Mas em uma hora estaríamos em Curitiba. Isto eu poderia agüentar.

Estômago embrulhado, comida de avião e 7:10 estávamos a 20 míseros minutos de Curitiba quando o piloto gentilmente nos cumprimenta pelo microfone... e avisa que Curitiba, sendo Curitiba, está coberta da neblina típica dos lugares frios e pouco acolhedores. Em outras palavras: o aeroporto estava fechado para pousos e decolagens.

Eu pensava comigo mesma “não pode ser, não pode ser”. Recrutei todos os anjos e santos até a terceira geração dos meus antepassados e dei-lhes um ultimato: “vocês têm vinte minutos para resolver isto!” E iniciei o Rosário digno dos desesperados. Eu deveria saber que anjos e santos não gostam de ultimatos.

O aeroporto não abriu e seguimos para a próxima parada: Cascavel, no oeste do Paraná. Por que Cascavel, a 500 km de Curitiba? Porque como tínhamos comprado a passagem com uma empresa menor, ela não tinha autorização para pousos e decolagens ao redor de Curitiba, e assim começava a nossa saga.

Mais uma hora de vôo e rosários e incertezas. A visão do aeroporto de Cascavel era daquelas que se tem em filme americano, quando o mocinho aterrissa nos confins do México e dali segue de pau-de-arara para encontrar a mocinha.

Nosso pau-de-arara, por sua vez, era um micro-ônibus habitado por uma barata, uma abelha e um motorista pra lá de estranho. Ele teve a santa incumbência de nos levar até Foz do Iguaçu, ainda mais longe de Curitiba, para que pudéssemos, se não apreciar as Cataratas, pegar um vôo Tam às 4 da tarde, o único da região a ir para Curitiba ainda naquele dia.

Éramos vinte, entre mais e menos desesperados e estressados, mas todos com a sensação de que tinham perdido o dia, com exceção da senhora com Alzheimer, que a cada 5 minutos esquecia tudo novamente. A filha tinha decidido levá-la a um encontro familiar de avião para poupá-la do estresse da estrada... Como nós.

Por falta de alternativa melhor, nos conformamos e nos dirigimos ao único restaurante do Aeroporto Internacional de Foz do Iguaçu, onde a companhia aérea nos pagou uma refeição fria e sem opções, afinal, já eram duas horas da tarde. Nos consolamos em uma canja de galinha das boas que fora rejeitada pelos clientes anteriores. Mas canja por canja, já estávamos levando uma mesmo...

A última vez que estive em Foz, que também havia sido a única até então, eu tinha doze anos e estava em excursão com a escola. Desta vez, na falta de tempo ou disposição para fazer turismo ou compras, comprei um postal destes bonitos, pra gringo ver, pra lembrar deste dia memorável.

Doze horas depois da nossa saída de Campinas, pra não contar da saída de casa e deprimir de vez, chegávamos finalmente a Curitiba contabilizando quatro aeroportos, dois mil quilômetros e a possibilidade de, da próxima vez, ir de bicicleta pra chegar antes.

Ana Carolina Paes
Enviado por Ana Carolina Paes em 30/10/2006
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