DENTRO DAS MATAS

Dentro das matas

Um dia destes li um texto do Ferreira Gullar: "Dentro da Noite".

Ele narra a primeira vez que "viu" a noite. Ele foi narrando o quando, onde, em que situação de forma magistral, com muito sentimento que, aos poucos, foi suscitando em minha alma reminiscencias de um tempo imemorial... me vi transportado no tempo, quando, confesso que, "vi" por primeira vez, não a noite como o Ferreira Gullar mas os sons. Digo "vi" pois sou extremamente visual e muito pouco auditivo. Ele narra que aos oito anos, debruçado na janela a observar a Via Láctea quando pôde "perceber o silêncio infinito da noite cósmica que, de tão intenso, deixava ouvir até o rumor da grama crescendo..."

e eu, me vi vagando pelo bosque vizinho à fazenda de meus avós, enchendo minha vista de cores e tentando distinguir cada som do bosque. Ouvia o canto dos pássaros, o roçar das folhas, o alvoroço das aves, a brisa batendo nas folhagens, o zumbido das abelhas e o barulho que o Éolo fazia por puro divertimento. Longos anos se passaram, cresci, fui para a cidade grande, casei, fui pai, fiz negocios, descasei e fiquei sozinho. Para fugir da balburdia da cidade grande e curtir minha solidão, fui caminhar na(belíssima) Serra da Cantareira. Não consegui distinguir mais aqueles sons já mencionados. Comecei a ouvir outros sons, diferentes de tudo que já ouvira antes: o som das flores se abrindo, o sol aquecendo a terra, a grama bebendo o orvalho, e tambem o som dos meus sentimentos mudos, meus medos não confessados, minhas queixas silenciosas e comecei a entender o que está errado comigo, e aprendi que para solucinar meus poblemas existenciais era preciso mergulhar a fundo dentro de minha alma e ouvir meus sentimentos.

Continuo sozinho mas aprendi a ouvir sons assim como o Ferreira Gullar aprendeu a mergulhar dentro da noite...

...mas, a que distância estamos daquele "Poema Sujo" e dos sons do bosque da minha infância!

Pedro Gonzalez

Pedro Gonzalez
Enviado por Pedro Gonzalez em 20/02/2011
Reeditado em 29/05/2015
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