REMÉDIO PARA RATOS

Eu curtia o justo cochilão dos aposentados, depois do almoço, quando a Selene – que em cada volta de lua dá um jeito na bagunça aqui de casa – me alertou: – Tem sinal de rato na lavanderia! – Peraí, argumentei incrédulo. Lavanderia não é aquele cômodo com piso de cerâmica, paredes azulejadas até ao teto, máquina lavadora, armário com frascos de amaciante, água sanitária, sabão em pó... – Mas tem! Ela foi taxativa. E cabia a mim dar finalmente àquela fuzarca.

Logo na primeira loja de produtos veterinários aberta, já entrei perguntando: – Aqui vende remédio pra rato? O balconista, conhecido meu, tirando sarro com a minha cara, não perdoou: – Remédio, não. Mas carecendo de um veneno caprichado... Disposto a não correr risco desnecessário, adquiri o pacote completo. Além do vidro, naturalmente que com o veneno líquido: – É beber e o bichinho estica os cambitos! Prometeu o vendedor. Me garanti ainda com ele granulado, em duas embalagens. Azul para os machos. Cor-de-rosa para ratazanas e eventuais ratos gays... Sabe-se lá?

Eu mesmo calculei que era munição demais, para tão pequenina caça. Afinal, se o veneno cumprisse o anunciado na bula, bastavam alguns grãos roídos – azuis ou rosas – que o desinfeliz nunca mais perturbaria meus cochilos da tarde. Porém as coisas dificilmente acontecem conforme planejamos. As tais iscas serviram de ‘viagra’ para eles e fortificante para elas: a rataiada fez a maior orgia às minhas custas! Como derradeiro recurso, antes de socorrer-me dos préstimos de um gato do vizinho – afamado por não perdoar nem filhote de pássaro em gaiola –, parti para a segunda etapa do plano.

Alguém melhor entendido que eu deste lesco-lesco, alertou-me para o cuidado com a dosagem. Do contrário, pelo andar da carruagem... Pô, ratos e carruagem juntos, a última vez que se falou nisto foi na estória da Gata Borralheira! Como há males que vêm pra mal, pelo apetite demonstrado os invasores eram camundongos: a maior praga! E que eu botasse o veneno em tampinhas de garrafa de cerveja, pois usando as plásticas de refrigerante, estabanados os ladrõesinhos derramariam tudo, não bebendo nada!

Caso algum leitor sonâmbulo teime em acompanhar-me nesta estória, adivinhe onde resolvi campear as tais tampinhas? Eu tava nos meus quinze minutos diários de louro!... Fui ao Nilson’s Bar, esquecido da ameaça de vingança do seu proprietário, jurada após a publicação da crônica "Batman ou Zorro" e onde segundo sua interpretação foi ele por mim colocado no papel de ‘bandido’. Ainda assim, ou por isto mesmo, recebeu-me com a máxima simpatia, porém meio desconfiado como convém a todo botequeiro.

– O que é, que é? Deixa ver se entendi... Provocou o Nilson. Ocê quer tampinha de garrafa de cerveja pra colocar veneno de rato?! Mudo, meneei a cabeça confirmativamente! Aparentando suspeitar de trote ou pegadinha, ele me entregou uma caixa de papelão onde guardara o lixo do dia anterior, sugerindo que eu mesmo procurasse as benditas tampas. Mas gozador, e não resistindo à revanche, recomendou sério: – Pega só tampinha da Skol. – Por quê? Indaguei inocente. E ele dando uma risada gostosa, me fez ter vontade de mandar-lhe a mão na cara: – É que a Skol desce redondo! Não tem rato no mundo, que resista!

dilermando cardoso
Enviado por dilermando cardoso em 26/02/2011
Reeditado em 24/08/2011
Código do texto: T2816629