CRÔNICA DAS DEZOITO HORAS...

Dezoito horas. Era o que dizia a igrejinha vizinha da praça. Gente apressada, cansada, descontraída, irritada, eletrizante...era gente que não acabava mais. Fim de tarde de uma quinta feira como todas as quintas de todas as semanas. Passo pela praça apressada e faminta depois de um longo e tenebroso dia de trabalho. Motivo, morte de um dos donos da empresa. Gosto muito do meu trabalho, mas realmente, com perdão do trocadilho, essa quinta feira foi de matar. Resolvi comer alguma coisa ali mesmo, afinal, praça tem sempre a cara da casa da gente. Como não havia sobrado nenhuma mesa, resolvi me sentar num murinho próximo do chão, contei minhas moedas, poucas moedas e chamei o garçom, que aliás, era a cara do "magro" da dupla famosa "O gordo e o magro". Me lembro que fiz uma brincadeira com ele sobre a semelhança mas ele não gostou muito, vai ver não estava num dia bom. Deixei pra lá. Tomei um suco de laranja muito ralo, muito provavelmente, uma laranja para um copo de água e um pastel de cheirinho de carne. Tudo bem! A minha fome era gigante e como dizem que a melhor comida é a fome, mandei ver no meu lanche e achei delicioso. Depois de matar a tão temida fome, como de costume acendi um cigarro e me pus a abservar os casais naquela praça. Familias inteiras, amigos, casais homos, éteros, gente de todo tipo e pra todo gosto. Uma mesa em especial me chamou a atenção. Do ponto em que eu me encontrava a visão era panorâmica, dava até pra fazer leitura labial. A moça, bonita moça por sinal, não parava de estalar os dedos. A sua frente um homem muito bem vestido, barba feita e um belo bigode que lhe rendia muitos olhares femininos. Devia ter entre 40 e 45 anos. Ele apesar de mais velho, demonstrava muita inquietação, parecia muito apreensivo. Comecei a fantasiar tentande decifrar o que de fato acontecia com aquele casal. Voltei a realidade e vejo quer havia chegado uma senhora, que poderia ser a mãe de um dos dois, ou dos dois, sei lá. NUm gesto carinhoso a senhora segura a mão dos dois dá um terno sorriso e pude ler seus lábios dizendo: Meus filhos! Bom, uma parte da história eu já sabia, eram irmãos. Fiquie ainda mais curiosa. (É que eu tenho um certo fascínio por encontros familiares), e a sorte me ajudou. Vagou uma mesa bem ao lado da deles, não deu outra, corri e acabei chegando primeiro que um casal jovem que também aguardava uma mesa. O problema era minha grana que tava muito curta, mas resolvi pagar pra ver. Pedi mais um copo daquela água misturada com laranja e comecei a ouvir a conversa da senhora com os dois. Ela não perdia o sorriso nos lábios e a doçura no olhar e com essa mesma doçura, disse-lhes: Tenho em minhas mãos o resultado dos meus exames e resolvi chama-los até esta praça por ser um lugar onde as pessoas brindam suas alegrias e celebram a vida. Pois bem, quero falar à voces de minha vida, que será interrompida aqui no plano material para ser retomada em outro plano, plano onde encontrarei pessoas queridas que me aguardam e onde aguardarei voces meu filhos. Eu não pude conter e comecei a chorar sem que alguém percebesse. Os tres se abraçaram como quem celebra a vida, sem lágrimas, sem tristezas, sem espanto. Na verdade o espanto era meu. Vi o quanto tenho que aprender e me desapegar da vida terrena, das pessoas queridas que partem, do medo do desconhecido...Essa minha parada na praça foi de grande valia. Paguei minha conta, terminei de secar osa olhos e acho que sai dali um pouco melhor do que entrei...