Por Toda Uma Vida

Hoje, não tenho a menor dúvida que a convivência entre seres humanos é uma arte que envolve uma complexidade sem precedentes. Inexoravelmente, colocamos os nossos interesses pessoais, os nossos sentimentos mesquinhos, destrutivos ou não, toda carga de experiências vividas ao longo dos anos, bagagens de mão que insistimos em transportar por toda uma vida, sem compreendermos o real valor de cada item nela colocado, nem enxergamos o quanto demodê são esses sentimentos.

Guardamos por décadas sensações de amor, ódio, compaixão, frustrações, medos reais, medos fictícios, crenças tão surreais capazes de nos causar danos implacáveis: não sou bom o bastante, não sou capaz de fazer isso ou aquilo, não sou inteligente o suficiente, ninguém me ama, “farinha pouca o meu pirão primeiro”, sou gordo demais, magro demais, temos sempre uma desculpa conveniente para enganar a nós mesmos, e nos fazer acreditar que iludimos os outros. Com isso criamos em nossas mentes monstros avassaladores, fantasmas mentais, no fim das contas assombramos a nós mesmos, e aumentamos as contas bancárias de psicólogos e psiquiatras, não desmerecendo o trabalho importantíssimo que esses profissionais realizam.

Falamos de amor, mas em nome da paz entramos em guerras; pregamos a bondade e, comumente, somos incapazes de nos doarmos a serviços voluntários que possam minimizar a dor alheia, cantamos a liberdade e vez ou outra, aprisionamos alguém dentro de um amor que julgamos legítimo, mas que não passa de um ardil para oprimirmos em nome de nosso egoísmo doentio. Mentimos, traímos, abandonamos, agredimos, viciamos, ofendemos, omitimos, prostituímos, degradamos, contrariamos, desapontamos, menosprezamos, frustramos, decepcionamos... O que foi feito da simplicidade, da amizade, do amor-próprio, da bem-aventurança, do enternecimento, da esperança, da fraternidade, do sorriso sincero, do abraço apertado, do apreço, do bom dia descontraído, do olhar nos olhos, o que fizeram com as velhas e boas cartas, do cheiro da tinta no papel, do envelope perfumado, da alegria de estar próximo, da pura essência de viver?

Não quero sair desse mundo como quem desce do vagão em movimento, mas antes de tudo, quero sentir o calor da vida humana, pessoas de boa vontade a embarcar comigo nesse trem, e juntos trilharmos o caminho para um mundo melhor.

Erminio Rezende
Enviado por Erminio Rezende em 13/03/2011
Reeditado em 01/04/2011
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