Semana Maior

O choro dos que choram diante dos muros de Jerusalém ou dos passos da Paixão de Cristo não é propriamente uma secreção lacrimal do cérebro. A memória da alma humana arrasta o ser humano, de tempos em tempos, a esses momentos em que cada um se recolhe à semente de si mesmo para celebrar a glória do seu Deus.

A palavra "glória" não é das mais fáceis de ser identificada etimologicamente. Expressa quase sempre o que os gregos chamavam de "phostagogia", isto é, uma iluminação que leva ao conhecimento, como nas "photosphoréias", as festas noturnas em que se levavam archores para iluminarem os caminhos e o rostos das pessoas. Para saber quem eram elas.

Em outros tempos, entre outros trabalhos, dedicava-me a procurar as origens das palavras. Anotei assim as passagens do Antigo e Novo Testamentos em que aparece essa palavra - "glória" - . Jamais cheguei a uma conclusão definitiva, mas constatei que a Bíblia ao falar da glória de Deus, é para com isso significar o seu conhecimento. A glória de Deus é ser conhecido e reconhecido como Deus, isto é, como o Ser Supremo, o Senhor Onipotente, Compassivo e Misericordioso.

León Bloy conta, a propósito disso, a história de um pecador bêbado que chegou à eternidade. Morreu bêbado e chegou bêbado diante de Deus, Juiz Supremo, que apenas o olhou, viu os horrores de toda a sua vida desregrada e pronunciou a sentença: - "Para o inferno!" - Cambaleando sobre as pernas bambas, o bêbado, que talvez tivesse sido advogado neste mundo exclamou: - "Apelar, para quem?" - Disse o Senhor Deus: - "Pois Eu sou o Juiz supremo, sou a própria Justiça, e não há instância, não há justiça alguma acima de mim".

Então o bêbado, que talvez não tivesse sido advogado, mas teólogo ou monge, contestou: -"Apelo da vossa Justiça para a vossa Glória!" Salvou-se por certo, pois o mais alto dos atributos de Deus é a sua Glória, a realidade e a presença daquele que é - o Deus de Abraão, Isaac e Jacó, o Adonai que não tinha nome e que de si mesmo dizia: "Eu sou aquele que é".

Pois é.

A Semana Santa está prestes a ser celebrada em todo o mundo cristão. Um bilhão de seres humanos, em todo o planeta, tem seus dias voltados, neste período de agonia do Filho do Homem, para a glória do Filho de Deus, em memória do maior gesto de amor e de liberdade que se registra na história da humanidade: a livre escolha do sacrifício do Cristo Jesus pelo amor dos homens.

A caridade (amor) e a liberdade são inseparáveis. O amor deve ser absolutamente livre. O amor é amado por si mesmo, e não determinado por qualquer outra coisa fora de si... Só Deus é perfeitamente livre, infinitamente livre. Só a caridade (amor) é perfeitamente livre. "Deus charitas est" proclama João, o evangelista.

É sobre essa pauta que meditam os homens nos dias da Semana Santa, evocando a Paixão e a Morte, a Ressurreição e a Glória do Mestre de cada um de nós, pois é o Mestre da História. Só alcançaremos a liberdade e o amor seguindo seus passos. Esta é a lição da Semana Santa.