ALGUMAS VERDADES SOBRE A MENTIRA

"Alô! Quer falar com quem?

Pode ligar mais tarde? A pessoa não se encontra no momento".

Talvez essa seja a mentira mais falada todos os dias. As mentiras inofensivas estão constantemente presentes na vida de todo mundo. Elas não são ditas com o propósito de prejudicar ninguém e muitas vezes são usadas para não ferir sentimentos ou para transmitir solidariedade e até mesmo para se autopromover.

Essas pequenas mentiras quase nunca causam preocupação ou remorso em quem faz uso delas e muitas vezes produz um efeito bastante positivo em quem as ouve, servindo de conforto, de estímulo, de consolo, dependendo de cada situação.

Mas é muito importante lembrar que mesmo as mentiras aparentemente inofensivas podem apresentar consequências imprevisíveis e desastrosas. A pessoa que se acostuma a dizer mentirinhas inofensivas pode habituar-se a mentir e perder o parâmetro e, dessa forma, não mais enxergar a dimensão da mentira que conta. Nesse caso, a pessoa fica sem a capacidade de discernimento e não consegue mais enxergar a possibilidade de ser desmascarada.

As pequenas inverdades ou mentiras inofensivas escondem pelo menos dois grandes problemas. O primeiro deles é com relação às crianças que convivem nesse ambiente. Crescendo e sendo educadas nesse meio elas podem achar isso uma coisa natural e, a partir daí, concluir que as mentiras fazem parte do cotidiano das pessoas, pois as crianças são incapazes de identificar as consequências desse ato. O outro problema, também muito grave, se refere à quebra da confiança. Uma pessoa submetida a uma mentira, só será capaz de prever sua reação depois de medir o efeito produzido pela notícia ou pelo fato divulgado.

Depois que o laço de confiança é quebrado, sua reconstituição é um trabalho penoso e muitas vezes irreversível. Familiares cortam relações, amizades são desfeitas, uniões são definitivamente rompidas e, muitas vezes passam a reinar a inimizade, a mágoa e até mesmo o ódio.

Apenas para que se possa ter noção sobre aquilo que pode resultar de uma pequena mentira, suponhamos a seguinte situação. Um indivíduo é casado e tem um filho de seis anos. Sua sogra, todos os anos, reúne a família por ocasião do Natal e sempre serve como sobremesa um determinado doce. O genro, embora tenha verdadeira adoração pela sogra, detesta a iguaria, mas, incapaz de contrariar a mãe da sua esposa, sempre elogia e, para agradá-la, é até capaz de comer mais um pedaço.

Mentirinha pequena, sem segundas intenções, mas mentira. A esposa, como não poderia deixar de ser, sabe do fato e até admira o marido pelo seu martírio.

Suponhamos que o netinho, na sua inocência de criança, um dia, sem qualquer maldade, conte para a avó a verdade sobre a paixão do pai pelo doce do Natal. Que reações teria aquela senhora que pode, muitas vezes, ter contado com orgulho às amigas sobre a preferência do genro pela sua sobremesa?

Em primeiro lugar, mesmo que a atitude tivesse a intenção de agradar a sogra, sua primeira reação seria a decepção por haver sido lograda anos a fio. Depois, assomaria a dúvida: quantas outras mentiras ele me contou? E a desconfiança: ele mente para minha filha. E, por fim, a certeza: com um pai desses, meu neto vai ser mentiroso.

Mentirinhas inofensivas precisam ser evitadas? Sempre que possível, sim. Algumas são compreensíveis e perdoáveis, às vezes até mesmo necessárias, como Papai Noel e Coelhinho da Páscoa. Mas a verdade é sempre a verdade.