Um texto sobre burocracia em três vias

Talvez um dos elementos mais odiados da vida moderna seja a burocracia. Quando se pensa em burocracia imediatamente vêem á nossa mente aquela imagem de algo lento, demorado e absurdo. Pilhas de papéis e uma enorme fila, para muitos isso definiria "burocracia".

O sociólogo Max Weber, um dos pensadores que mais se debruçou no tema da burocracia, nos diz que ela nasceu para melhorar nossa vida. Como pode, então, ela exercer hoje papel totalmente diferente?

Inicialmente, o poder não tinha uma racionalidade, existiam certas funções que podiam ser feitas por qualquer um e que não tinham muitos critérios para ser executada. Com o tempo, a sociedade foi crescendo e se expandido e com isso foram surgindo mais funções e menos tempo para se dedicar á mais de uma atividade. Assim, nasce o burocrata. O burocrata é uma das engrenagens que permite o Estado continuar vivo.

Costumamos associar burocrata á figura de um homem preso em um gainete (aliás, burocrata vem de "bureau" que significa em francês gabinete ou escritório), mas burocracia vai muito além disso. Podemos entender todo funcionário público ou membro de uma instituição como burocrata.

No entanto, com o tempo, o burocrata deixou de ser uma das engrenagens para se tornar um obstáculo. Obstáculo para quem? Para o homem comum, sempre. Isso reflete o caráter que o Estado tomou a partir do século passado e que foi muito bem retratado pelo escritor tcheco Franz Kafka: aquela instituição forte e impenetrável, cujas razões parecem á nós bizarras.

Em alguns países contudo a burocracia não se tornou impenetrável porque o Estado tornou-se uma fortaleza, pelo contrário, nesses países o Estado faliu e nos presenteou com isso uma burocracia ineficaz e difusa, como é o nosso caso.

Aliás, para fechar o texto, apenas uma observação: interessante como muitos de nossos escritores parecem ter dialogado com a burocracia. Ora, muitos eram eles mesmos funcionários públicos. Machado de Assis, por exemplo, fala de um departamento obscuro do Império. Carlos Drummond de Andrade deu boa parte de sua vida ao Ministério da Cultura enquanto funcionário menor. Em Drummond o peso da burocracia é muito grande e podemos perceber isso quando ele se declara um "escravo em papelópolis". Mas essa sua condição era, ao mesmo tempo, sua desgraça e sua maior inspiração. Sua poesia e sua sensibilidade, traumatizadas com a poeira dos escritórios, sabia muito bem ser viva por causa dessa experiência.