Confiança cega.

Quando decidi construir minha casa, sabendo do espaço que havia, passei meses projetando, esquematizando, colocando os móveis, pois não poderia trocar os que possuía.. Sua posição no terreno tinha que permitir que a casa de minha filha, que fica nos fundos, continuasse com vista para a rua e não ficasse “sufocada”.

Cuidei com a distribuição das peças, para que o quarto pegasse sol o ano inteiro, mas não o dia inteiro. À noite ele está fresquinho, sempre. Enfim, cada móvel tinha seu lugar definido, na planta que elaborei, antes de procurar o arquiteto. Fiz muitos cálculos para ter a certeza de que teria fundos suficientes para a construção da casa. Tudo contadinho, na ponta do lápis.

Qual não foi minha surpresa, quando recebi dele o projeto e ele o havia alterado de tal maneira, que eu teria que mandar fazer móveis sob medida. Olhei para ele decepcionada. Ele me olhou sem entender também. Sentei e expliquei calmamente que o projeto teria que ser exatamente como eu o fizera, que o meu orçamento não incluía móveis novos.

Uma semana depois retornei ao escritório dele e ele mostrou o novo projeto. Estava quase igual ao meu, mas ele decidira trocar de lugar a porta do banheiro. Tanto eu, como o construtor falamos que a planta não seria aceita pela prefeitura, pois a porta abriria de frente para a cozinha. Alicerce pronto, já com a estrutura conforme a planta, ela foi rejeitada como prevíramos, por causa da tal porta. Conclusão, tive que trocar a porta de lugar e para que ela não abrisse para dentro do pequeno escritório que ficava aqui, onde vos escrevo, eliminei a parede que o separaria da sala. Assim, mesmo tendo feito tantos cálculos antes, a distribuição dos móveis ficou totalmente alterada. E um tanto atrapalhada.

Contei essa história para ilustrar o que venho constatando já há algum tempo. Não pretendo generalizar, mas acredito que muitos profissionais da maioria das áreas que trabalham com o elemento humano, não prestam atenção aos seus clientes, na medida que deveriam.

Arquitetos, engenheiros, decoradores, realizam os projetos, para eles, não para os proprietários das casas. Vejo projetos de decoração caríssimos, que nada têm em comum com os moradores das casas. Casas projetadas com desníveis e degraus, para moradores idosos, com problemas de locomoção.

Na área da saúde, acontece o mesmo. E com repercussões muito mais sérias.Há profissionais que têm na ponta do lápis, o remedinho certo para tudo. Só que não questionam se é o melhor remédio para aquele paciente. Generalizam. Não entram no mérito da questão. É a pressa.

Embora seja inconsciente talvez, há profissionais ótimos em todas as áreas, que menosprezam nossa capacidade de entender as coisas. Vivemos numa era em que o uso de aparelhos dentários virou moda. Claro que uma dentadura perfeita além de saudável, faz bem ao ego. Aí o paciente fica várias semanas sem comer, sofrendo dores terríveis, até se adaptar. Quando pensa que o martírio acabou, vem o reajuste e recomeça tudo. Geralmente o profissional só fala da beleza do sorriso que o aparelho proporcionará, após muitos meses de uso, em alguns casos. Não fala da mastigação, da respiração, e tal e coisa. Isso é secundário.

É comum encontrar pessoas indo à farmácia para comprar a medicação que lhes foi receitada, sem saberem para que o remédio é indicado. Não são esclarecidos pelo profissional. Muitas vezes tratam apenas os sintomas, e a causa vai crescendo,só vindo a prestar uma maior atenção ao paciente, quando já se faz tarde para determinar um diagnóstico preciso, que poderia salvar sua vida.

Para o paciente que apresenta dificuldade com o sono, prescreve-se um remédio para dormir. Rápido e certo. Mas por que o paciente está com essa dificuldade?

Em tudo isso, os culpados somos nós, que não questionamos as coisas que são do nosso único e exclusivo interesse. Confiamos excessivamente nos outros. Se são profissionais, estudaram para exercerem suas profissões, mas são seres humanos como nós. Passíveis de errar. E à medida que nossa confiança cresce, deixamos a solução de nossos problemas nas mãos de pessoas que mesmo sendo bons profissionais, podem não ser os melhores na área do relacionamento humano.