MISÓGINO NA ORDEM DO DIA

Um pouco das duas coisas, isto pode até dar certo, como diria o autor de auto-ajuda: anarquia e democracia. E aí é onde mora e dormita o lado bom – se é que isto é bom – do sistema político brasileiro. Não é assim mesmo? Aqui, sem choro baixo, é o tudo se pode. Do folclore à extrema direita, aqui todo mundo é elegível. Ninguém sobra na curva das urnas. Ninguém dança nem vai cassado de véspera. E o Tribunal Superior Eleitoral ainda faz teste de alfabetização para canonizar o candidato. O Tiririca que o diga. E, assim, no Brasil, continuam sendo eleitos os tipos mais estapafúrdios.

Mário Juruna, aquele cacique que gravava até pensamento dos seus pares deputados. Sem dúvida, o mais puro e inocente que já passou por Brasília. Agnaldo Timóteo, o cantor (como eu, botafoguense), mas cheio de espalhafatos. Débora Soft, a dos ‘strip-teases’ e cópulas, ao vivo, na boate, ex-vereadora, aqui, em Fortaleza. Nada contra, mas ‘gays’ e lésbicas, todos eles gente bem resolvida e assumida, sem nenhum projeto, só a dizer abobrinhas no plenário e na imprensa. Nada contra. Não são filhos de Deus e da Pátria? Clodovil, pérolas nas entrevistas, etc. e tal. Romário, atleta que caloteava pensões alimentícias. Assassinos, serralheiros de corpos humanos, contrabandistas; bobos da corte, péssimos piadistas. Até tarados sexuais, e por aí vai um desfilar de gente do nosso folclore.

Mas, de todos eles, agora, ninguém passou tanto os pés pelas mãos como esse oficial da reserva, o hoje já bem tri-eleito deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ). Para a senadora Marinor Brito (PSOL-PA), “Bolsonaro é misógino”. Há dias, com ele, numa sessão tumultuada, parece que no plenário do Senado, a senadora teve um tremendo arranca-rabo com o maior representante da direita, no Congresso Nacional. Viche, minha Nossa!... Foi o maior ‘bafulê’, como diz aqui o comunicador João Inácio Júnior, que cunhou o termo.

Quando o deputado Jair tentava baldear uma entrevista da senadora Marta Suplicy, no auditório da casa parlamentar, a senadora Marinor Brito tomou as dores e foi o maior rebuliço. A entrevista que foi atrapalhada versava “sobre a suspensão da votação do projeto que criminaliza a homofobia” (ISTOÉ, 18 mai/2011). No calor do bate-boca, o “representante do povo” (um ‘reaça’ de marca maior) distribuiu o seguinte deboche: “Ela (Marta) não pode ver um homossexual na frente. Só que deu azar duas vezes: sou casado e ela não me interessa”.

O deboche, na boca do ‘depufede’ direitista – e o termo ‘depufede’ é do grande Stanislaw Ponte Preta – tem sido uma constante, ao longo de sua já veterana carreira parlamentar. Tudo por obra e graça da mente miúda de um eleitorado inconsciente. Sem desfazer da maioria, uma minoria, no Rio de Janeiro, elege até cobras, ratos e jacarés.

A senadora querelante com Bolsonaro lembra, em boa hora, que o deputado é chegado a atacar mulher, no Congresso, assim se expressando: “Tudo o que ele falou é nojento, teve a atitude de uma pessoa desequilibrada, que não merece representar o povo”. E desabafa, ainda, prometendo levá-lo à “Justiça comum por injúria e danos morais”: “Ele já agrediu a mim, a ministra Maria do Rosário, a deputada Manuela d’Ávila, a cantora Preta Gil. Quantas mais vai agredir? Ele é um misógino, tem aversão à mulher.”

Claro que, mais uma vez, sem uma ação punitiva da Câmara Federal, à qual pertence o excelso racista e ‘reaça’, o artista de extrema direita Jair Bolsonaro nada sofrerá. Nada, nem ao menos um bom sabão de advertência. Como todos, cá, no paraíso da impunidade, ele sairá esgaravatando os dentes. Mas uma coisa fica bem clara, nisso tudo: a palavrinha ‘misógino’ (‘que ou aquele que apresenta misoginia’, no Houaiss), passou à ordem do dia. E “misoginia”, no mestre Aurélio, quer dizer “desprezo ou aversão às mulheres”. Ou, ainda, na Psiquiatria, conforme a mesma fonte, “repulsa mórbida do homem ao contato sexual com as mulheres.”

Na novela do SBT, “Amor e Revolução”, há um oficial assim, misógino, impotente e torturador. É o major Filinto, homônimo do nazista Filinto Müller, lá da ditadura Vargas. Não estou a fazer “ilações”, como disse aquele outro, em comentário à nossa crônica anterior. Estou mesmo é afirmando com todas as letras que o hoje deputado – reacionário, direitista, misógino – tem todas as ferramentas do major Filinto da novela do SBT.

Por tudo isso, e já muito mais pelo arranca-rabo da senadora paraense com o deputado carioca, ponta de lança da reação brasileira, vamos pôr aqui na ordem do dia esta palavrinha boa e vocês, aí, vão-se deliciar com ela – MISÓGINO.

Fort., 18/05/2011.

Gomes da Silveira
Enviado por Gomes da Silveira em 18/05/2011
Reeditado em 18/05/2011
Código do texto: T2977791
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