DIÁRIO DE UMA VIAGEM – PARTE FINAL

... João Pessoa, na Paraíba, amanheceu chuvosa, na Sexta-feira da Paixão. Os corpos cansados, pela longa e desgastante viagem do dia anterior, dormiam a sono solto, sem terem hora para se levantar. No apartamento, portanto, se fazia silêncio, quebrado apenas pelo metralhar dos pingos que batiam nas janelas de vidro do mesmo.

Sem ter muito o que fazer, dormitando, optei por experimentar, deitado, uma reflexão sobre a aventura da viagem. E cheguei à conclusão de que os mistérios que compõem a natureza são imprevisíveis e que, quando eles resolvem se juntar, para compor um cenário, tudo caminha para um mesmo ponto. É o que chamamos de coincidências.

Perto das nove horas, todos se levantaram. Obedecendo aos rituais cristãos, o respeito foi a regra do dia. Ainda mais que a matriarca estava presente. Assim, o peixe foi preparado de acordo com o costume e servido, na hora do meio-dia, sem muito alarde.

No sábado, mãos à obra. Munido de uma furadeira, buchas e parafusos, eu e o namorado da minha filha, fomos colocar cortinas nas janelas, chuveiros elétricos nos banheiros e, depois, fazer uma faxina geral, desta vez, sob as ordens das “patroas”.

Domingo, logo cedo, chamei a todos e propus irmos tomar um banho de mar. Bem, chamei e fui me “arrumar”. Mas, esqueci que as mulheres iam também. Já viu, não é? Haja tempo para sair (não tenho nada contra, mas que dá uma impaciência, ah isso dá!). Isso foi lá pelas nove horas. Meio-dia, nós saímos em direção à praia do Bessa. Lugar tranquilo, águas limpas, mar na medida certa para se tomar banho de “cuia”. E vocês acham que eu sou besta de ir até o “fundo”? É no “rasinho” mesmo, de cócoras, com as mãos em concha e jogando água “pra cima da cabeça”. Meus filhos se aventuraram mais. Não muito, pois não deixei. De qualquer maneira, foi muito gratificante. Depois, o almoço. Na praia mesmo.

No domingo à tarde, a emoção se fez presente quando fomos assistir à Santa Eucaristia – na sede da Comunidade Shalom – e vimos o nosso filho servindo na Liturgia. Como diz o ditado: Deus escreve certo por linhas tortas. Confesso que, ao vê-lo, ali, compenetrado, sendo um servo do Senhor, o meu coração bateu mais forte. Lembrei-me das preocupações passadas e de como estava difícil preservar a minha cria das coisas do mundo. Mas Deus, na Sua infinita sabedoria, traçou um caminho bom para ele.

Melhor ainda foi perceber que a missa estava tomada de jovens que louvavam ao Senhor e que, diante do altar, no final da cerimônia, dançavam, cantavam, mostrando não se deixarem iludir pelas “maravilhas” passageiras – mas que deixam cicatrizes profundas – do mal. Na minha concepção, ainda há esperança de um futuro melhor, pois eu vi corações bons, mentes sábias e sentimento de confraternização, de coleguismo e de amor ao próximo.

Fui dormir, no domingo, com a sensação de que tudo tem seu tempo para que as coisas aconteçam e, a mim, só resta agradecer pela vida, pelo privilégio de testemunhar os acontecimentos, pela caminhada na prática do bem e por ter alcançado a felicidade de nunca haver me desviado do objetivo de ser um cidadão pleno.

Segunda-feira. Hora de retornar. Pense numa hora difícil! Ter que voltar e deixar, longe de nós, os filhos, é doloroso. Por isso, eu sempre sou o primeiro a sair. Despeço-me e desço. Assim, ninguém vê as lágrimas que escorrem e nem o entalo que me dá no peito. Mas, hora de partir é hora de partir. Depois de muitos abraços, lágrimas e beijos, saímos da cidade mais arborizada do Brasil e iniciamos o caminho de volta. O trânsito estava de médio para alto. Com cuidado, percorremos o trecho entre João Pessoa/PB e Parnamirim/RN. Quando estávamos entrando na cidade, ao chegarmos perto de uma passarela existente, o tráfego ficou lento. Os carros diminuindo a velocidade e, logicamente, nós também. Só que, quem vinha atrás de nós, estava ao volante de forma desatenta. Resultado: a traseira do meu carro foi “beijada” violentamente pelo carro que vinha imediatamente atrás do meu.

Depois da pancada, eu desci do carro. Ele, o condutor do outro veículo, se mostrava nervoso. Tentei acalmá-lo e disse que, se o carro dele estava segurado não tínhamos motivos para discutirmos. Nesta hora, outros motoristas disseram que ele era quem estava errado e, como ele tinha certeza disso, resolveu ligar para o seu corretor (ele bateu sem nem ter acionado os freios. Um sinal claro que vinha desatento. Provavelmente, falando ao celular. Não sei. Suponho). Mediante a promessa de que iria providenciar o sinistro, nós liberamos a via (imagine o engarrafamento!).

De volta à estrada, na descida do Itajá, já perto de Assú, eu entrei para Ipanguassú. Fui fazer uma visita a minha mãe biológica. Engraçado! No carro, ia a minha mãe adotiva. Era, na minha vida, a segunda vez que isso acontecia. E, quando eu cheguei à fazenda, tudo aquilo em volta me fez recordar os tempos de meninote. Do curral do gado, ainda estava lá o poço de onde eu tirava a água – puxada por uma bomba manual – para dar de beber ao gado. Só que, no lugar da bomba manual, uma elétrica. Na frente do alpendre, o parque de vaquejadas. Eu, particularmente, nunca participei de uma. Preferia ficar no alpendre, sentado numa “espreguiçadeira” sonhando com “as coisas lá de fora daquele mundo”. “Tia Alice” saiu e eu pedi a benção e a beijei. É sempre assim. Apesar de não ter sido criado por ela, a ela eu devo a minha vida. E, a minha mãe adotiva, a minha formação.

Finalmente, chegamos a Mossoró. Dei graças a Deus por nada mais ter acontecido. Ah! O senhor que bateu na traseira do meu carro? Bem, até esta data, nem ele e nem o corretor cumpriram com o que prometeram. Parece que palavra, hoje em dia, é "artigo" em extinção. Assim, o que me restou foi acionar o meu seguro e tomar providências para ser ressarcido na minha franquia...

 

Obs. Imagem da internet


 
Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 22/05/2011
Reeditado em 18/04/2019
Código do texto: T2985735
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