Filhos

Por que será que as pessoas ainda têm filhos neste mundo tão ruim? Antes, perguntava-me isso. Já hoje, não me pergunto mais. O que mudou? Lembro-me de um episódio, um bota-fora entre amigos do qual não cheguei a estar de corpo, mas, em espírito, se isso chega a ser possível, pelos olhos de outra pessoa, estive lá. Ex-amigos de faculdade, faixa etária igual, solteiros e enrolados, um casal sem filhos, outro com. Em algum momento, a conversa girou em torno do porquê ter filhos, e do porquê não. É maravilhoso, embora difícil, disse um cônjuge do casal com. Não quero nem saber disso, já disse à minha esposa: se ela engravidar será o fim!, chocou a mesa o rapaz do casal sem. Que boçalidade! Entretanto, conhecendo-se a história de sua família, poderíamos entender: desiludido por um amor, tirara um dos irmãos a própria vida. Sendo o caçula, ainda pequeno na época, difícil crer que tal fato não tenha marcado nosso rapaz. Quando perdemos alguém que amamos parece normal ter medo de voltarmos a amar, seja um outro, um bicho, ou um filho, que dizem muitos é um amor todo especial. Temos medo do que não podemos controlar, e amar é assim. Tememos perder o chão se viermos a perder quem amamos, trememos ao pensar que nunca mais conseguiremos nos levantar. Mas, sem riscos não se vive, a vida é assim. E amar é um risco, o jogo de azar mais antigo aliás, jogo no qual, segundo a lenda primeira, a da Criação, até mesmo Deus perdeu ao apostar que o amor venceria sempre as disputas do escolher. Sim, criei-te e dou-te livre arbítrio, ama-me. Há quem jure que isto não exista, um tal direito de escolher. Nem mesmo Deus pode forçar alguém a amar, é o que essa lenda diz. Anos se passaram e recebo notícias do casal sem, agora com: uma linda menininha viera ao mundo ensinar ao pai o que é amar. E ele mudou, de rocha para água, de cabeça a coração, enfim, transformou-se num maravilhoso e cuidadoso pai, orgulhoso e feliz. Por que as pessoas têm filhos ainda? Difícil responder. Uma parte de nós ainda é bicho, diz a outra lenda, a da Evolução. Assim sendo, por vezes é mais forte o instinto da procriação. Já eu, o que digo? Ter filhos é parte da vida e dá sentido a muitas coisas. Coisas que, não sabendo por ora explicar, contento-me em sentir, com gosto e deixando-me levar, sobremaneira pelo amor. No tocante a filhos, parece mesmo ser verdade: apesar das dificuldades, é algo maravilhoso sim, muito bom!

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