208 - O RETORNO do CAVALEIRO ANDANTE ..

 
 

Ele andou e cavalgou por mais estranhas terras...
 
Quando voltou das guerras imaginárias que empreendera ao longo da sua vida retornou para o repouso do guerreiro... Trazia no semblante as marcas das muitas batalhas. Seu porte, antigamente elevado, tipo altivo e garboso agora contrastava de antigo feitio e forma.
Suas longas pernas, agora pareciam ainda mais arqueadas e encolhidas denotando o desgaste pelos muitos anos que cavalgara mundo afora a defender os fracos e oprimidos. As mãos, outrora fortes ao empunhar suas imaginarias armas, agora demonstravam um tremor inquietante como se estivessem apagando algum soneto dedicado à sua amada, que ele rabiscara no pergaminho do tempo e da vida.

Como menestrel ainda segue cantarolando e recitando poemas de amor à sua dulcíssima Dulcinéia, embora muitos dos seus escudeiros, agora denominados de "cuidadores na sua velhice", admitissem nada entender da sua maneira de falar ou ignorado idioma.
O Cavaleiro se aposentara e com ele seu belo e imaginário cavalo Rocinante. Agora ele "pilota" estranha carruagem conduzida por mãos humanas em vias estreitas de cimento e cal que contrastam com as imensas pradarias, montes e colinas que se descortinavam aos seus olhos na juventude e nas suas andanças.

"Agora basta fechar os olhos e relembrar... Via à direita o Pico do Amor, encimado por belo cruzeiro feito em carvalho de centenárias árvores dos nossos bosques e matas". Ainda de olhos fechados ele via à esquerda Pico do Cauê que desaparecia entre nuvens azuis e brancas e se postava rodeado por belo bosque de exuberante mata atlântica. Na retaguarda ainda se lembrava onde ficava aquela montanha de azul pó de minério que abrigava os gringos da terra da Rainha, que para cá vieram com incumbência de devastar as belezas da sua terra. E que agora eles não mais sairiam das entranhas da mesma, para sempre quedariam inertes bem longe do solo pátrio.

Agora ele transitava numa cadeira com rodas por simples e longos corredores de uma casa que sabia não ser a sua e que não guardava qualquer semelhança com os corredores dos palácios dos seus pais.
Não mais estava “senhor” de suas faculdades mentais nem mesmo dos territórios herdados por seus antepassados desde o tempo do Império.

Cabelos aos ventos, não mais, agora, amaravam-nos como a um rabo-de-cavalo... Ele achava aquilo uma blasfêmia, que poderia ser cobrada a fio de espada ou por anos nos calabouços do palácio real.
Mas, os ditos cuidadores não permitiam que cruzasse os portais do grande salão de festas, onde outrora, lautos almoços e jantares como os realizados num passado longínquo, nas hospedarias D’EL’REI quando em certas visitas ou alguma homenagem ao bispo do reino da província mineral deste quadrilátero ferrífero chegava em visitas oficiais ou não.

Aqueles Cavaleiros ao redor da Távola que girava em um eixo que colocava os tampos em superposição como um pião do “Grão-Vizir” aquele que dizia aos "peões" que se virassem para executar esta ou aquela tarefa. “O dono de toda arrogância” o mesmo que responderia por período como comandante daquele palácio-mor, aonde só existiam os hospedes especiais da fidalguia “lentes ouropretanos”.
Ele olhava atentamente buscando descobrir naqueles rostos, também já carcomidos pelo tempo, postados e perfilados como se fossem encarar uma batalha, trajavam roupas comuns sem as cores e adereços do "Reino de Tutu Caramujo".

Naquela mesa comprida, que nada tinha a ver com a de forma circular de outrora, onde os quitutes e manjares elaborados e servidos pelas damas da cozinha do palácio real, as mesmas que atendiam por estranhos nomes: Olinda e Yolanda. Ele não descobrira sequer uma semelhança, um rosto, ainda que somente um.

Daqueles cavaleiros que no passado batalhavam nas Minas do Rei, calçando longas botas e esporas para cumprir as ordens do dia. As mesmas que apregoadas lá da Capitania de Estácio de Sá, determinavam para que domesticassem homens e máquinas.
As diversas tarefas de arrancar as riquezas, que se transformariam em encouraçados metálicos de muitos pés de comprimento e muitos nós de velocidades e se transformariam também em aços especiais que fariam troar canhões e bazucas. As ordens emanadas cumpridas a ferro e fogo!

A casa aonde ele estava agora, era a mesma antiga hospedaria de El Rei, mas, nenhum rosto ali, lhe parecia familiar.
Eu soube pelos arautos do reino, através de informações apregoadas a quatro ventos, a boa nova: “O retorno do Cavaleiro Andante”.

E eu que o imaginara transformado numa paisagem, agora sei, que o estado de saúde do nobre Cavaleiro, não difere muito do jeito como o vemos, cada vez mais triste e perdido nos devaneios das suas lembranças...

 
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CLAUDIONOR PINHEIRO
Enviado por CLAUDIONOR PINHEIRO em 10/06/2011
Reeditado em 16/02/2012
Código do texto: T3026424