SIM, A VIDA TAMBÉM RECOMEÇA, AOS 40

Sim, a vida recomeça aos 40, também!

Lembro do meu pai, feliz, em seu aniversário de quarenta anos, dizendo “A vida começa aos quarenta.”

Dois ou três anos mais tarde, fui visitá-lo no hospital (pós-cirurgia). Uma rápida recuperação. Estava muito bem e como ele mesmo disse: “Pronto pra outra”. Logo em seguida ele completou: “Agora entendi porque dizem que a vida começa aos quarenta. Aos quarenta passei a sentir dores que nunca senti, me canso mais rápido, tenho menos fôlego e força, aumentei o grau dos óculos e de quebra enfrentei uma cirurgia...”

Por outro lado, foi nessa mesma época que ele decidiu parar de fumar, passou a fazer alguns exercícios esporádicos e caminhadas e como se as mudanças em sua vida já não bastassem, ainda foi convidado pela empresa onde trabalhava a exercer um novo cargo, deixando uma vida profissional de vinte anos na área técnica para ocupar um posto administrativo. Por conta da nova função precisou estudar alemão, língua que hoje (outros vinte anos depois, ele domina). Ou seja, naquele momento, meu pai começou, realmente, uma nova vida.

Há alguns poucos anos (já bem próximo dos 60 de idade) veio à aposentadoria e meu pai, novamente, resolveu experimentar novos ares. Deixou a empresa onde trabalhou por mais de 35 anos para abrir seu próprio negócio. Mais uma vez estava começando vida nova.

Quando nasceu minha primeira filha, a vida de pai começou para mim... E ao mesmo tempo uma outra nova vida também começou para meu pai (a de avô)... Hoje, minha filha mais velha já está namorando e eu, consequentemente, estou vivendo uma nova vida. (Confesso que por essa eu não esperava. Pelo menos não agora. Mas, como não escolhemos à hora de nascer, quando eu menos esperava, sem me dar conta, já estava nesta nova vida de sogro).

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Dia desses reli Recomeçar (poema de Carlos Drummond de Andrade) que inicia com os seguintes versos: “Não importa onde você parou…/ em que momento da vida você cansou…/ o que importa é que sempre é possível e

necessário recomeçar”. Eu era um garoto quando li esse poema pela primeira vez e, como todo garoto em tempos de descobertas, fiz a leitura associando os versos ao amor e a paixão, ignorando a parábola com a existência. Agora, próximo de começar minha vida aos quarenta, compreendi a magnitude do poema. Olho para trás e vejo que minha vida já começou (ou recomeçou) várias vezes; aos 7, 10, 15, 18, 20, 30, 34, etc... E já estou louco para nascer (de novo)... Sou um feto dessa nova vida que me virá aos 40...

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Nesse momento, penso se seria possível colar os diferentes tempos uns nos outros. Juntar essas vidas todas que começaram com cada um dos ritos de passagem de idade. Cheguei a conclusão que sim, a vida não começa aos 40, ela apenas recomeça e a cada recomeço, verificamos que a vivência anterior vai ficando mais azul, mais distante e as lembranças da nossa existência faz-nos virarmos para dentro de nós mesmos, e voltar tempo afora, perdidamente para verificar que em cada uma dessas vidas, em cada recomeço, um pouco de nós ficou para trás, deixamos uma porçãozinha de nós em cada pessoa que passou por nossa vida, assim como acrescentamos um pouco de cada um daqueles que amamos e assim vamos recomeçando, acrescentando experiências que vão ficando cada vez mais douradas, nítidas e próximas, bem ao alcance de um piscar de olhos e assim vamos reconstruindo a vida, nos edificando, evoluindo e com o último verso do poema de Drummond, termino também este texto:

“Porque sou do tamanho daquilo que vejo, e não do tamanho da minha altura.”

Marcelo Nocelli
Enviado por Marcelo Nocelli em 11/07/2011
Código do texto: T3089011
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