Ciúmes

Parafraseando Guilherme de Almeida, que termina o poema O Ciúme dizendo, sobre sua amada, “tenho ciúmes de quem não te conhece ainda, e cedo ou tarde te verás, pálida e linda, pela primeira vez”, vou contar que tenho ciúmes parecidos.

Um certo zelo velado pelas boas sensações que experimentamos e que não se repetem. Não para nós, mas apenas para os que ainda irão experimentá-las. Ciúme mais ou menos como o do poeta, ainda que mais singelo do que este irrecuperável ciúme da primeira visão de uma linda mulher.

Exemplos?

Ciúmes da insegurança de quem vai sair de mãos dadas com a namorada pela primeira vez.

Da euforia de quem ainda vai passar no vestibular e ver seu nome no listão do jornal (só depois cai a ficha de que difícil mesmo é não passar na maioria dos vestibulares).

Da felicidade de quem dará início a muitas amizades de sala de aula, no colégio, na faculdade, onde for, e, sem que precise esforço, manterá as melhores.

Da irracionalidade de quem se tornará um fiel devoto de uma banda de rock (como eu fui duas vezes, pelo menos) e deixará crescer o cabelo, vestirá camisetas da banda, rasgará as calças, aprenderá a tocar um instrumento, formará uma banda com os amigos.

Do esforço de quem passará uma noite sem dormir apenas para descobrir como o dia amanhece (mais tarde viramos a noite ao natural e nem sempre é tão poético).

Tudo isso e muito mais já foi novidade em nossas vidas antes de se tornar comum. E poucas coisas guardam o sabor das primeiras vezes. O que não podemos reviver, desejamos que outros vivam igual. E não cansamos de falar o quanto foi bom. Mas só até onde o nosso ciúme permite.

Andrei Andrade
Enviado por Andrei Andrade em 23/08/2011
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