Minha vizinha era o que havia!

Sempre que surge uma oportunidade, gosto de passar os finais de semana na minha casinha de praia. Viagem rápida. Não sei nem mesmo se podemos chamar isso de viagem, já que não levo nem duas horas pela estrada. Normalmente, vou num sábado e retorno no domingo.

A casa fica incrustada num terreno com corredores nas laterais, com um espaço mínimo de quintal, mas com um jardim um pouco maior à sua frente. Gosto muito do verde e, por isso mesmo, esses espaços são preenchidos com uma pequena diversidade de plantas. Por lá, a vizinhança é muito pacata, especialmente, em finais de semana comuns. De um modo geral, o convívio maior é com os nativos da região e, quase nunca, com os vizinhos de muro.

No entanto, num desses tantos dias de descanso que estive por lá, tive a grata satisfação de reparar em algo que ainda não havia prestado muita atenção: a minha nova vizinha. Aquele final de semana tinha tudo para ser como outro qualquer, não fosse por ela que estava lá, ao alcance dos olhos, para quem quisesse ver.

O que vem, a seguir, talvez desaponte ou acabe com a expectativa de alguns leitores (pelo menos, do sexo masculino) de plantão. É que, na realidade, a vizinha a que me referia era uma linda beija-flor esverdeada com listras pretas. Esse foi para mim um momento tão fora do comum, que precisava ser relatado. Afinal de contas, não é todo dia que você tem a graça de ter dentro de sua propriedade um ninho de beija-flor!

Minha vizinha havia feito sua construção em um galho de um pé de pitanga no corredor lateral da casa. Por explicações que só a própria natureza saberia dar, ela escolheu exatamente aquela pitangueira, entre tantas outras opções. Para completar o cenário, a proprietária do empreendimento esteve a maior parte do tempo presente, chocando seus dois ovinhos. Pelo formato, mais pareciam comprimidos de aspirina, talvez menores, de tão pequenos!

Tudo muito impressionante! O tamanho do ninho equivale a um ovo grande de galinha ou de pata! O revestimento interno, branquinho, mais parecia acolchoado de algodão. O externo, amarronzado, como que modelado com folhas secas. O ninho, em si, estava suspenso e aderido ao galho da pitangueira, balançando ao vento, dada a sua flexibilidade. Aparentemente, ele estava muito exposto à chuva! Fiquei pensando como minha vizinha estaria se virando em meio às chuvas, que não são tão frequentes nessa região, mas que poderiam levar por água abaixo todo o seu serviço.

Estive a menos de um metro do ninho, com aquela criaturinha ali, parada, “imexível” e, somente com as penas do rabinho e a cabeça do lado de fora. A observação era recíproca. Umas das cenas mais lindas que já pude presenciar. Creio que por instinto natural, a proteção de seus ovinhos estava acima de qualquer aparente "ameaça". Talvez, por essa razão, ela não se intimidava com a minha presença.

Fiquei imaginando, também, como uma criatura daquele tamanho, extremamente pequena, frágil e com um bico que media não mais do que um centímetro, fora capaz de construir com tamanha perfeição aquela obra de arte. Quanto tempo teria levado? Quantas viagens teria feito em busca de matéria-prima para o preparo daquela morada? Como teria se virado para “grudar” aquela estrutura em um galho tão articulado?

Minha caseira me revelou que essa era sua segunda ninhada. Fiquei surpreso e feliz ao mesmo tempo! Mais contente ainda por ela ter escolhido aquele espaço para procriar e perpetuar uma espécie tão linda e tão delicada. Digamos que, por um curto período, ela tenha se tornado a minha vizinha mais ilustre.

Foi uma pena não estar com uma máquina fotográfica na hora para registrar aquele espetáculo. A mãe natureza é mesmo muito sábia, mas o meu esquecimento foi de uma bobeira imperdoável! Tem certos momentos na vida que são únicos. O tempo me mostrou mais uma vez que, tendo passado, dificilmente voltam a acontecer. Infelizmente, foi o que aconteceu. Numa oportunidade seguinte, não pude mais clicar esse instante e, muito menos, bater uns dois ou três dedos de prosa com a minha vizinha. Ela já havia partido.

Mano Kleber
Enviado por Mano Kleber em 31/08/2011
Reeditado em 26/10/2012
Código do texto: T3193183
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