O terrorismo que salvou Bush

Quando um governo esgota todas as técnicas para lhe garantir poder e popularidade, a última cartada é o terror. O povo pode não se impressionar tanto com o desempenho da educação, da saúde, da economia, nem se preocupar o bastante com o nível de corrupção ou de desigualdade social, mas todos se abalam quando a questão é segurança. Dinheiro, raça, religião, nacionalidade, parecem pouco importar quando a vida está em risco. Perto da morte, todos são mais iguais uns dos outros e ficam igualmente empenhados em buscar uma solução para o problema.

Uma das formas do poder tornar as pessoas mais manipuláveis é criar e/ou exagerar o terrorismo no meio em que elas vivem. O perigo está sempre por perto. Assassinos e ladrões nos mais diversos níveis de intensidade podem ser encontrados em qualquer esquina, mas quando o governo põe isto em evidência, a população fica apavorada. E se, logo depois de explicitar um problema, o mesmo governo se apresenta como a mais eficaz solução, é óbvio que ele será desejado. As pessoas passam a clamar pelo poder e por suas manifestações de autoridade sobre a sociedade. O governo norte-americano soube explorar isso muito bem.

O primeiro mandato de George W. Bush era pouco memorável até que o ataque de 11 de setembro feriu o ego dos Estados Unidos. É reconhecível a gravidade da tragédia, mas o tratamento que o governo deu ao acontecimento foi intenso e inteligente. A repercussão do ataque ganhou proporções gigantescas. O mais terrível episódio dos últimos tempos, o mais cruel, covarde e sangrento. Junto veio a propaganda do horror terrorista, os impiedosos assassinos que colocam toda uma nação em estado permanente de alerta. E Bush sempre lá, defensor dos oprimidos, o justiceiro a punir os malditos ladrões de vida, a vingar cada pessoa que sofreu a perda de alguém querido, a evitar mais lágrima no futuro.

Foi assim que a popularidade do governo cresceu. Toda vez que a população esquecia um pouco do terror, o termômetro de perigo nos Estados Unidos passava para um nível mais crítico. Quanto mais eminente era um novo ato de violência, mais necessário Bush e seus colegas pareciam aos olhos do povo. E, na época das novas eleições presidenciais, quando a maioria dos norte-americanos já havia se libertado do trauma terrorista, e Bush tinha sua popularidade abalada, apareceu Bin Laden na televisão invadindo os lares dos cidadãos para dizer-lhes que suas vidas estavam em risco e que um novo ataque estava à espreita. Era o que faltava para garantir a reeleição de George e calar algumas vozes contra sua guerra milionária no Oriente Médio.

Quanto mais o poder investe no terrorismo, mais as manifestações do terrorismo ganham destaque na mídia, mais a população fica em pânico, maior o desespero por segurança e mais influenciáveis as pessoas se tornam diante das declarações do governo. Não importa se o perigo é real ou virtual, o poder que se põe como salvador de um povo - que foi condicionado pelo próprio poder a estar constantemente apreensivo - ilude muita gente, fazendo parecer justificável qualquer atitude que visa à segurança da vida.