O domingo. O dia comum. O fumo. O vazio. O tédio. A vida.

Domingão. Um despertar pouco antes do almoço. Um almoço na casa da vó para quem não é vó ou na casa da mãe para quem não é vó, não tem vó e não tem que almoçar na casa da sogra. Um jornal. Fofocas. Outro cochilo no meio da tarde. Um cigarro. Um café e um pão com manteiga. Cerveja. O medo do próximo dia. Um retrato antigo na estante da sala. Lembranças. Pessoas que se foram. Nostalgia. Chegou visita. Visita indesejável. Visita desejável. Pensamento empreendedor. Oportunidades perdidas. Outra página do jornal da cidade. É sempre bom ver os classificados mesmo sabendo que não irá comprar nada. Talvez até ligue para um dos anunciantes. Coluna social. Preocupação com a vida dos outros. Tragédias – mortos e feridos. Outro cigarro. Mais uma cerveja que sobrou da noite de sábado (ah se fosse sábado!). O problema é que amanhã é segunda. Tédio.

O tempo é tão cruel que não tem como lembrar se durante a infância eu diferenciava os dias da semana. Estranho. É muita inocência não saber diferenciar o domingo dos outros dias. Ou ser inocente é acreditar que o domingo é um dia diferente? (“crianças fazem perguntas sobre tudo, mas nem todas as respostas cabem num adulto”). Não há motivos para haver tédio, afinal. Isso apenas porque os ponteiros do relógio estão andando – a única razão para não ficar parado (que deveria ser a suficiente).

O tédio é a miséria da vida. Deveríamos nos culpar por estarmos entediados.

Durante o seu tédio, pessoas precisam de um abraço.

Durante o seu tédio, muitos filmes ainda não foram vistos.

Durante o seu tédio, alguns livros deixam de ser lidos.

Durante o seu tédio, há protestos parados que por outros entediados poderiam ser mobilizados.

Durante o seu tédio, a sua voz pode ser o remédio para alguém.

Durante o seu tédio, você espera algo que nem você sabe o que é. E como eu digo em alguns dos meus versos, “quem vive sempre a espera de algo ou alguém, simplesmente corre o risco de esperar eternamente”.

Durante o seu tédio, a vida passa. A vida que se diz tão curta. A vida da qual você não quer abrir mão. A vida que só precisa ser vivida.

O tédio é um vazio. E um vazio pode e precisa ser preenchido. E se você se transborda, não cometa desperdícios. Sentimentos bons não podem ser restos. Divida-os com outras pessoas.

Dentro de um domingo pode haver um sábado. Dentro de um livro pode haver uma ideia. Dentro de uma musica pode haver uma esperança. Dentro de uma cerveja pode haver um diálogo. Dentro de um cigarro pode haver uma paz. Dentro de um vazio pode haver um tédio, ou pode haver a vida.