Em defesa dos bobos

"É quase impossível evitar o excesso de amor que o bobo provoca.

É que só o bobo é capaz de excesso de amor.

E só o amor faz o bobo" (Clarice Linspector).

Fico feliz com Clarice Linspector pelo seu escrito sobre os bobos. E concordo realmente com a intelectualidade dos mesmos, pois, remontando à idade média, os bobos da corte eram pessoas simples que, através da retórica, divertiam pessoas cultas, tendo, é lógico, a adulação monárquica como objetivo de sua existência.

Bobo é um estado de vida. Pode-se viver bobamente. Os apaixonados me confirmam isso. Dizem que burros mesmo são aqueles que discutem as razões do amor com um apaixonado, pois as respostas são tão vagas e abstratas como a sua própria linha de raciocínio. Mas em compensação os sentimentos acerca do amor são sólidos como a bola de chumbo algemada aos pés.

Assim como a saudade, a paixão é um sentimento que precisa não se realizar para existir. É o objeto de amor ausente que não pode estar perto. "Paixão pela pessoa presente é doença", segundo Rubem Alves. Não doença de amor, mas desequilíbrio psicológico. Os bobos sabem disso e não racionalisam. Eles sabem e acabou. Pra quê questionar sobre isso?

Um dia me peguei escrevendo coisas bobas, próprias de apaixonados, o nome da pessoa que amo combinando, como palavra cruzada, com o meu. Depois desenhei alguns coraçõezinhos uns flechados e outros por inteiro. Escrevi mais de uma dezena de vezes o nome dela.

Nome...

Realmente "o amor faz o bobo", pois não há utilidade prática em escrever mais de uma dezena de vezes o nome de uma pessoa, sendo ela, amada ou não. Uma só é a utilidade prática na repetição da escrita. Castigo. Assim pensam os espertalhões. Imagino a repugnância dos espertos em pensar que um dia poderiam passar a ser bobos. Que humilhação!

O amor é um sentimento - transfigurante e transubstâncial - de dedicação absoluta de um ser a outro, ou a uma coisa. Daí, alguns filósofos diziam que "o amor produz a semelhança entre quem ama e o amado", e ainda, "o amor não só iguala mas sujeita o amante àquilo que ama". Logo, não há espertos que se rendam ao amor e que não se tornem bobos.

Ser bobo é qualidade de quem ama, parafraseando Agostinho de Hipona.

Walter Welington
Enviado por Walter Welington em 01/01/2007
Reeditado em 01/01/2007
Código do texto: T333242
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