Gripe suína: eu sobrevivi

Andei lendo algumas crônicas antigas que escrevi - hoje em dia, todas renegadas. Vez ou outra, eu puxo delas alguma ideia, uma frase, uma piada, e só. Eu era capaz de escrever sobre a gripe suína e concluir falando que "só a pandemia nos une". Isso foi em 2008. Três anos! Três anos e, ao contrário do que eu temia, não morri de gripe suína. Na verdade, quando escrevi essa crônica, ninguém ainda havia morrido disso no Brasil. Eu tentei então dizer que o problema da gripe suína era que, "ao contrário das outras doenças, ela não atinge apenas os pobres, os sem-higiene, os pretos e os gays – é por isso que a sociedade se alvoroça".

E prosseguia citando alguns dados que havia pescado rapidamente na Internet: "28 mil pessoas morrem todos os anos de água contaminada - que causa hepatite A, cólera, febre tifóide e outras doenças de pobre. A malária, doença de selvagens, atingiu 40.551 amazonenses nos dois primeiros meses deste ano - e o estado comemora, pois houve redução". Mas veio a gripe suína e, de repente, todos tiveram algo para se preocupar - dizia eu. Era um texto curto, escrito em tom irônico.

Naquela época, eu ainda morava em Curitiba - e isso fez toda a diferença. Morasse em Brasília e não sofreria nada. Mas Curitiba é a capital mais fria do Brasil, aquela em que o vírus da gripe é transmitido com maior facilidade. E bastou ser confirmada a primeira morte por gripe suína na cidade para que um verdadeiro pânico se instalasse entre nós. Que fazer? Como não ser contaminado? De repente, alguém lembrou do álcool em gel. Precisávamos lavar a mão com álcool em gel. Muito bem. Só que álcool em gel não se acha em qualquer mercadinho não - lá onde eu morava, pelo menos, não se achava. Enquanto isso, as mortes aumentavam.

Resolvi ir aos hipermercados. E o problema foi que todo mundo teve essa ideia - ou seja, em pouco tempo não havia mais álcool em gel disponível na região. Nas redes sociais, recebíamos informações privilegiadas: "Fui ao mercado tal e ainda tinha hoje cedo". E então uma multidão de pessoas ia até o mercado tal. Verdade é que as mesmas redes sociais também aumentavam o pânico, já que se alimentavam os boatos mais improváveis, com pessoas afirmando que o número de mortes oficiais estava muito abaixo do real - isso seria uma estratégia do governo para não alarmar ainda mais a população.

O melhor era evitar sair de casa. E para andar de ônibus? Santo Deus! O transporte coletivo, mesmo o de Curitiba, é um punhado de mãos encostando em todos os ferros possíveis e, consequentemente, transmitindo o vírus da gripe suína. De modo que andar de ônibus naquela época representava risco de vida. Alguns, precavidos ou medrosos, passaram a usar lenços ou luvas - não encostavam em nada com a mão limpa. Havia os que usavam máscaras cirúrgicas. Ai daquele que espirrasse! Seria linchado ali mesmo. E apesar de alguns que diziam não ter medo algum, o clima das viagens era pra mim de preocupação.

Além disso, eu vivia um drama pessoal. Precisava viajar para encontrar minha namorada em Brasília. Imaginem só: viajar! Isso significava ficar trancado dentro de um espaço em que o vírus circulava livremente. Não não, o melhor era esperar essa pandemia passar, ser controlada. Viajar não era recomendado. Mas vai explicar isso pra minha namorada, que vivia na seca Brasília, cidade em que o vírus da gripe morria de insolação. A ela, parecia que o meu medo era maior do que o meu amor - e realmente era.

Depois de três anos, o medo passou - e o amor, vejam vocês, também.

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 22/11/2011
Reeditado em 22/11/2011
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