SER GENTIL

“Você tem que estar pronta às oito porque o jantar começará às nove, precisamos chegar sem atraso.” ele falou e logo desligou o telefone.

Ela ficou pensativa por um tempo, regurgitando aquelas palavras que soaram como uma ameaça. Seu marido ligou avisando de um jantar que deveriam participar, mas por que essa sensação ruim que se sente agora no estômago. Chega a ter palpitação, seu coração bate depressa. Odeia sentir isso.

Essas sensações só vem quando se sente obrigada a fazer algo que não gostaria de fazer, mas está sendo obrigada. Isso! Está sendo obrigada! Não está sendo convidada, tem que ir. Simplesmente isso.

Fica tonta como se tivesse levado um tapa. Poderia ir sem problemas, mas a condição é que a impedia de assimilar o jantar.

Ele sabe que ela vive em seu próprio mundo com a sua rotina e que dificilmente gosta de sair dela. Se sente segura sabendo onde pisa. A sua casa é o seu refúgio. Não gosta de outros lugares. Ele sabe disso, então por que chamá-la para o tal jantar? Não sabe que ela ficará nervosa, ansiosa e de forma rude conversará com as pessoas? Ele não a conhece? Já se esqueceu de como ela é?

Tudo tem de ser aos poucos, palavra por palavra sem alteração para que ela possa se acostumar e naturalmente absorver o que está acontecendo.

Ele sabe das consequências de tal ato, depois não tem como reclamar.

Ela sobe para o seu quarto e procura uma roupa para vestir, tem que se aprontar. Poderia simplesmente se recusar a ir, mas aí surgirá um conflito que ela não gostaria de lidar agora. Prefere o jantar a ter uma discussão.

Durante a escolha, lembra da primeira vez que se encontraram. Foi num ponto de ônibus, pegavam o mesmo ônibus quase no mesmo horário. Ele puxou conversa algumas vezes, mas ela só foi polida, procurava não prolongar a conversa. Ele foi insistente. Gostou dela. Gostou do jeito dela. Gostou da sua quase monossilábica conversa, do modo que procurava não aprofundar em nenhuma assunto. Gostou da sua solidão.

Por que agora a obriga a participar de reuniões de que ela não gostaria de estar?

Por que insiste em que ela se ajuste a um mundo que ele sabe que ela jamais fará parte?

Ela pensa nessas coisas e não consegue achar uma resposta que a convença de que ele só está fazendo pensando que será melhor para ela participar, às vezes, de algumas reuniões, conversar com outras pessoas, conhecer outras pessoas.

“Acho que o meu silêncio já não é suportável para ele. Ele gosta de mim mas quer me ver em meio a outras pessoas como seu eu pudesse gostar disso.”

Veste-se. Está pronta. Fica sentada esperando por ele.

Sente-se vazia, sem forças. Não negará essa saída, mas não está alegre neste momento. Satisfação não a tem. Não a sente.

Fará um esforço para ser gentil. Ser gentil. É a única coisa que conseguirão dela está noite.

Estará anestesiada e nada verá, tudo que falar, tocar, comer e ver não serão absorvidos. Estará completamente ausente, hoje mais do que o normal.

 

katialimma
Enviado por katialimma em 07/12/2011
Reeditado em 07/12/2021
Código do texto: T3376645
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.