Uma Bela Tarde Curitibana.

Tinha ido buscar uma encomenda na agência central dos correios ao lado da universidade federal.

Em posse de meu pacote que continha camisetas (as minhas já estavam cheias de rasgos, buracos de brasa de cigarros & roídas pelas traças) compradas via éter e com a chave da minha caixa postal já guardada no bolso da calça jeans desbotada e rasgada na altura da coxa esquerda, decidi caminhar pela rua XV e beber um chope preto naquele botequim de cachorro quente tradicional. Quarta feira, quinze de trinta e seis da tarde e os termômetros marcavam vinte e oito graus célsius. Ia caminhando devagar, fumando um cigarro de filtro amarelo e devidamente protegido do ser humano pelos meus óculos escuros e os fones de ouvido que estouravam um thrash metal oitentista com uma profusão de guitarras distorcidas e batidas perfeitas. Essa música desagradável, demente, obsessiva e doentia sempre me fez meus lábios sorrirem e minha mente se abrir. Se você tem preconceito ou isso fere seus tímpanos sensíveis, foda-se. A rua estava – como sempre – coalhada de suburbanos com suas sacolas das Lojas Americanas e dos desocupados de plantão. A “Borboleta 13” apregoava seus bilhetes da loteria federal com seu indefectível sotaque que me dizia “olha a cobra, corre hoje. “ O “Homem Estátua” também estava por ali cultivando seu câncer de pele. A vida passa e tem gente que não vê... Foi na altura da Monsenhor Celso que aquele perfume floral invadiu minhas narinas. A barulheira continuava pegando nos meus ouvidos e então decidi conferir de que linda mulher vinha aquele agradável olor. Não deu outra: meu olfato privilegiado captou aquela beldade maravilhosa com um sarí que nada deixava para a imaginação. Pernas espetaculares, bunda de parar o Largo da Ordem em noite de sexta feira, cabelos castanhos com mechas californianas escorrendo uns sete centímetros abaixo dos ombros. Apertei o passo para emparelhar com ela. Fiquei-a seguindo de perto. Seu perfume me colocava em puro estado do êxtase. Parecia que ela vindo direto de Haight-Ashbury circa 1967 e acabara de chegar em uma máquina do tempo ao século XXI. Uma linda hippie chique que caminhava pela rua mais conhecida daqui da cidade. Queria ver seu rosto e fiquei a uns dois ou três metros bem ao lado dela. Se deus existe e esculpiu aquele rosto jogou a formula fora. Um nariz aquilino que combinava perfeitamente com sua boca fina e os dentes que reparei um pouco amarelados pelo consumo de nicotina ou talvez de erva. Usava um piercing no nariz e outra argola em seu lóbulo esquerdo. Seus olhos castanhos pareciam emanar serenidade & sabedoria. Caminhava muito elegantemente. Dir-se-ia que ela parecia fluir. Uma criatura etérea e celestial que se movia pelo plano mundano. Quem flutuava a um metro do chão agora era eu. Tinha vontade de aproximar dela. De puxar conversa. De descobrir quais eram seus sonhos e aspirações, se ela gostava de ouvir Tom Waits tomando vinho argentino ou se preferia champanhe francês com uvas, se ela tinha estudado e se formado, se ela gostaria de ser minha amiga, namorada, noiva, esposa & mãe dos meus filhos. Queria saber quais neuroses, incertezas e desenganos passavam por sua cabecinha linda e sensual. Queria afagar aqueles cabelos, queria segurar seu rosto com minha duas mãos calejadas pelo labor braçal de esteta, queria beijar seus lábios, minha língua na dela, dar-lhe um abraço pela cintura e amá-la perdidamente nem que fosse por uma efêmera noite. Queria escrever-lhe odes e loas ajoelhado aos seus pés lindos naquelas sandálias rasteiras. Queria dizer-lhe que por trás dessa minha cara amassada de alcoólatra terminal ainda batia um coração puro e repleto se sentimentos nobres. Queria que ela fosse meu mundo. Talvez eu estivesse sendo superficial, porém estava sendo honesto comigo mesmo. Queria saber inclusive para que time ela torcia ou se detestava futebol como eu. Delírios. Delírios e delírios. Continua a seguindo de perto e aquele som louco reverberava em meus ouvidos e embalava meus pensamentos. Eros e Tanatos. Amor e morte. Tudo que existe. Ela entrou em uma loja de joias. Tive vontade de raspar minha conta bancária e comprar o que quer que desejasse para ornar aquele corpo maravilhoso e enxuto. Queria assinar qualquer papel que confirmasse nossa união legal. Continue caminhando e dei a última olhada para tão amada criatura. Por alguns minutos essa mulher foi a mais amada do mundo. Andei mais um pouco e quando cheguei ao botequim os garçons de sempre e o proprietário me cumprimentaram como sempre. Pedi um chope preto e um estanho que virei de um trago só e pedi outro.

Minha mente esvaziou em dois minutos.

Suspirei para o caneco.

O que eu poderia fazer?

Apenas tentar escrever.

Curitiba, 19 de janeiro de 2012, 28 graus célsius – Verão.

Geraldo Topera
Enviado por Geraldo Topera em 19/01/2012
Código do texto: T3449948
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