Ler é uma droga.
 
Para mim e para muita gente que conheço, ler é um prazer. Mais que um prazer, um vício que foi adquirido por mim, muito cedo. Minhas primeiras lembranças com a leitura remontam ao antigo armazém abandonado em casa de minha avó, onde todas as caqueiras eram colocadas. Era lá que meu tio, pouco mais velho do que eu, se escondia para ler os gibis do irmão mais velho. E eu com ele, certamente mais vendo as figuras do que lendo. Gibis não eram leituras recomendadas naquela época, para ninguém, muito menos para meninas analfabetas. No entanto tenho ligeiras desconfianças que foi ali que comecei a ler porque ninguém se lembra de como de repente eu estava lendo, mesmo sem ainda estar na escola.

Outra lembrança desses tempos que tenho, é de me ver pelas ruas de Arantina, levada por meu pai, para ler coisas escritas nas paredes e muros. O sentimento do orgulho que ele demonstrava por  mim é inesquecível e credito a isso a minha necessidade de cada vez ler mais e melhor.

Eu lia tudo o que caia em minhas mãos. Revistas em quadrinhos, gibis, revistas femininas, revistas infantis, religiosas e livros. Li meu primeiro romance aos oito anos, com sofreguidão, escondida no banheiro: O Garimpeiro, de Bernardo Guimarães. Livros bons e livros ruins, livros que reli mais tarde para compreender, livros que releio ainda e nos quais vou aos poucos descobrindo novas facetas, como se nunca os tivesse lido antes.

Foi lendo que aprendi a escrever, não apenas literariamente, também linguisticamente. A conquista do alfabeto foi determinante em minha vida, saber juntar as letras para comunicar-me com o outro e comigo mesmo, através das palavras. Nenhuma outra vitória sobrepujou essa, simplesmente propiciou outras.

Foi lendo que aprendi a diversidade da vida, as forças contrárias do bem e do mal, foi lendo que escolhi o meu lado, as virtudes imprescindíveis, as deficiências insuportáveis. É lendo que extravaso a emoção que se recusa a se mostrar através de minhas próprias dores e amores.

A leitura é a única droga que em vez de destruir, constrói. Através dela podemos penetrar em todos os mundos. Permitir que as pessoas aprendam a ler deveria ser o foco principal de todos os governantes do mundo, porque as pessoas que sabem ler, mas ler de verdade, que vai muito além do simples ajuntamento de letras, essas sim, podem compreender todas as outras disciplinas necessárias para fazer um mundo melhor.


Mas quem disse que os governantes querem um mundo melhor?