Pequenas Crônicas na Desertica Curitiba

Para Rapha & André Gorny, Babi Age, Flávio Salomão, André Tobler, Milla Silva, Icaro Castilho, Thaís "Amy Winehouse" & Carol Ribeiro que me proporcionaram uma noite maravilhosa e muito criativa naquela mesa do Saint Patrick's Pub regada a cerveja e um excelente bourbon. Namastê!

—Droga, segundo dia de greve de ônibus...

—Falei pra você comprar um carro à prestação quando recebeu seu décimo terceiro, mas você preferiu viajar para Parati...

— Mulher, você tem titica de galinha na cabeça? Ficava reclamando que nunca saíamos, que eu nunca te levava pra canto algum e ficou felicíssima quando comprei aquela passagem pra Parati pra você ficar bundando o dia inteiro e salgando esse rabão gordo na piscina e agora fica aí dando uma de “madura” & de “século XXI”. Será o Benedito? Eu tenho bola de cristal e iria adivinha que uma semana antes do carnaval esses cabeças de bagre iriam fazer greve? Será que você pensa com a cabeça mesmo? E eu lá sou trouxa de encarar 48 meses de prestação?

— Tá, tá, tá bom! Não posso fazer nem um comentário com você que me vem com quatro pedras na mão? Parece maluco! E quer me deixar maluca, se é que já não estou...

— Cadê os cinco reais que eu deixei aqui?

— Ora, dei pra Luzia comprar pão, leite e mortadela...

—Orra, mulher, você faz o que dá na tua cabeça, né? Nem me pergunta nada nessa casa!

— Vai. Vai de uma vez que são oito e quinze e você não vai chegar na hora do trabalho e sabe como é aquele teu chefe...

********************

O telefone do tocou:

— Gilbertão, más notícias! Eu perdi o meu dispositivo de antifurto do meu carro e agora cortei a gasolina. Estou aqui esperando um guincho ( ofegante e gaguejante ) ! Não sei onde foi parar essa coisa e tenho que ir até uma loja autopeças comprar outro... Tô desde as dez da manhã e nada desses caras aparecerem! Vou fazer uma força para aparecer. Sei que só está você e a Giana aí na redação. Não vou deixar vocês na mão! Pode cer. Segura minha onda aí?

— Vou fazer o possível mas não me deixe na mão. Vou desligar. Tá um inferno essa redação aqui...

*************************

—Tenho horror à greve!

—Fui sindicalista por doze anos e posso te garantir que todo movimento grevista tem sua razão de ser.

—Mas tem gente de depende deles para prestar esses serviços. Porque não fizeram concurso público? Porque não fizeram uma faculdade, se almejavam uma vida melhor?

—Porque nem todo mundo é dondoquinha de família rica do interior do estado que pagou apartamento, baladinha e faculdade para madame se formar e trabalhar em escritório de advocacia e ficar na sua bela mesa, com seu lindo computador de última geração pra ficar dando ordem pra estagiário que não sabe nem ler o que acabou de escrever.

—Sou madamezinha sim! E você com esse cabelão e essa barba de Che Guevara fica aí pelas sombras, com essa bebidinha vermelha, fumando cigarro gringo e se fazendo de grande intelectual e defensor dos direitos dos oprimidos? Pensa que eu nãos sei a sua tiragem e a sua vendagem de livros? Palestra em universidade, ficar uma ou duas horas divagando essas suas ideias de anarquismo e levando sete mil reais pra casa livre de despesa? Pensa que eu não tenho editoras como clientes?

—Eu batalhei por isso! Trabalhei vinte de tantos anos de pau pra toda obra, morando em pensão, dividindo apartamento com os piores psicopatas que você já imaginou, morando em despensa de favor em casa de amigos. Oito anos trabalhando no Poder Judiciário, aturando humores de todas as espécies. Trampando em redação de jornal redigindo nota de falecimento. Até de barman em hotel trabalhei. Se eu tivesse a oportunidade que seus pais lhe deram eu juro por deus que estaria fazendo PhD do meu quinto diploma...

—Mas o que isso tem haver com o que eu lhe falei da greve? Sabe o prejuízo que as empresas em geral devem estar tomando?

—E você acha que eu nasci ontem? Patrão e corporação têm mais é que tomar prejuízo. Se eu fosse um grande empresário e obtivesse um lucro astronômico no fim do ano fiscal você acha que eu iria embolsar tudo? Pra comprar mansão? Pra comprar iate? Pra ir até Los Angeles e depois voltar e ficar “dropping names” e chamar o Robert de Niro de “Bob” pra impressionar burguesia falida pseudo alemã da cidade? Nada disso, Lídia? Eu iria remunerar meus funcionários para não ter que passar por greve! As corporações só entendem a linguagem que elas mesmas usam. Violência. Paralisação. E nem entrei com socialismo ainda. Só utilizando do meu bom senso.

—Essa sua bebidinha tá com uma cara ótima.

—O barman daqui tem uma mão maravilhosa.

—Posso experimentar?

—Claro!

**********************************

—Tô adorando essa paralisação dos ônibus.

—Faz dois dias que está em casa largadão. Nem tomou banho ontem...

—Tomar banho pra quê? Pra se sujar de novo? Ei babe, que tal você fazer um rangão pra nós e aí a gente toma aquela cerveja e faz um amorzinho gostoso?

—Só depois do seu banho. E vou fazer rango com que homem de deus? Não tem nem um pedaço de pão seco em casa! Tá pensando que euvou ao mercado com essa greve? Deve estar mais parecido com a visão do inferno! Cada um que cuide do seu próprio estômago!

—Deixa comigo...Alô, é da pizzaria que entrega para o almoço? Ah, ótimo? Anota aí o pedido. Quantos sabores? Até quatro na gigante? Joia. Então anota aí: um quarto de calabresa com bastante cebola, outro quarto de frango com catupiry que a patroa adora, mais um quarto de quatro queijos e outro com alho e óleo. Uma garrafa de chá mate bem gelado e uma garrafa de vinho argentino. É isso. Pagamento em dinheiro...

Curitiba, 15 de fevereiro de 2012, 25 graus célsius, segundo dia da Greve do Transporte Coletivo, Verão.

Geraldo Topera
Enviado por Geraldo Topera em 15/02/2012
Código do texto: T3500840
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.