As surpresas do dia
 

A gente acorda e não sabe as surpresas que o dia nos prepara. E isso é o encanto e o desencanto da vida. É bom receber um abraço pela manhã, na verdade dois abraços, pois ela pediu para repetir: vinha eu descendo a rua quando do nada alguém me grita: Maria Olimpia, deixa eu lhe dar um abraço, minha professora querida! E eu claro, abri os braços, ninguém recusa um abraço, principalmente quando os olhos olham com olhar de sinceridade. E eu dei o abraço, tentando me lembrar onde e quando eu me tornara querida, mas sem conseguir. E ela pediu para repetir e repetimos porque depois de anos de terapia eu consegui finalmente me tornar uma abraçadeira de primeira linha. E com medo que perguntasse, lembra de mim, fessora, eu lhe disse a verdade que sentia, para distraí-la: Como você está bonita, menina! E ela, sabia que é disse bem simples – que nada, a beleza está nos olhos e quem tem beleza nos olhos vê tudo bonito. Como o Carnaval já passou e o Domingo de Páscoa também decidimos ao mesmo tempo parar com os confetes e seguir nossos caminhos e mais surpresas encontrei, ao fechar um negócio que há muito eu queria fechar:um contrato de publicidade com o melhor fotógrafo da cidade que produz um guia de negócios com empresas de fina estampa. Ou que ele torna fina com seu talento. E antes que ele acabasse de tentar me convencer eu lhe disse que podia parar de falar porque eu já sabia tudo a respeito de sua publicação e topava sim o negócio, em página dupla. E depois de longos papos, quando entre outras coisas fiquei sabendo que ele e a esposa estavam grávidos, antes de se despedir ele disse: Puxa, achei que a senhora fosse linha dura e que eu iria cortar miudinho para convencê-la, encontro uma pessoa simpática que sabe o que quer e resolve logo. E esses são os encantos da vida, as boas surpresas que nos são reservadas, mas existem também os desencantos e quando eles chegam  pesam tanto o coração que a gente precisa ficar pensando nas coisas boas para afastar a dor
Foi Fran, que trabalha lá em casa, quem me contou enquanto me ajudava a dar remédio para os meus pequenos: Deu no rádio hoje que um cachorro matou a dona dele. E aí, de alinhavo em alinhavo costurei precariamente a história contada pelo rádio, de uma mulher que foi morta pelo próprio cachorro, aqui mesmo em Lavras, mas sem que eu pudesse identificar nem um nem outro. Uma história anônima dói, mas a dor se torna insuportável quando os protagonistas passam a ter nome e endereço.
Foi Marilda minha irmã que afundou o punhal quando ao chegar à Padaria ela me perguntou: Soube o que aconteceu com M?
Agora a mulher tinha nome e sobrenome. Sem que fossemos amigas éramos conhecidas desde que cheguei aqui. Trabalhava em um banco em frente a nossa casa e mesmo depois que o banco se mudou continuamos a manter contato.  Era amiga de uma grande amiga minha, trabalhou com uma de minhas irmãs, tia de duas alunas muito queridas. Nem dois dias se passaram da última vez em que a vi e nos cumprimentamos amigavelmente. Agora ela está morta e quem a matou foi um cachorro que vivia com ela já há dez anos. E eu nem sei por quem estou mais triste, se por ela ou se pelo rottweiler que além de ter acabado com a vida dela, acabou com a própria destruindo anos de bons serviços.