DE CONTRAPÉ EM CONTRAPÉ (EC)

De que adiantaram tantos planos?

Existe a danação de ser pego no contrapé. E ninguém faz planos para ele.

Nunca, enquanto vivo, entendi o porque desse termo. Quem explica por que essas mancadas chamam-se contrapé?

Mancada... Pé... Tem certa lógica...

Claro!

Some-se a analogia com a contradança.

Imaginem...

Um casal está ao ritmo de uma válsica contradança. Par de pés indo... Outro vindo... Um sapateia com a ponta do salto agulha sobre o outro...

Ui!... lá... lá...

Após o gritinho, uma palavra impublicável e a indagação do dono do pé pisado:

A senhorita tem algo contra meu pé?

Anos de eruditas elipses sincopadas aferéticas e pronto: Surgia a nova palavra:

“Contrapé”.

Deve ser isso.

As definições gramaticais afirmam que contrapé é o apoio, a base, o esteio.

Discordo... Contrapé seria melhor definido como “couvert do canapé de confusão”, no sentido tosco da palavra. Contrapés, via de regra, são indigestos.

Quem é vivo sabe o que é sofrer por causa de uma pegada no contrapé.

Raras as pessoas que não se depararam com tais situações inesperadas e fora de controle. De repente, nos vemos em situações próximas de pagar um mico ou sermos obrigados a criar uma saída emergencial. Aquelas “tipo pela esquerda” ou “direita”, de acordo com a dominância do poder.

Atire a segunda pedra quem nunca teve de articular uma desculpa sem nexo para safar-se de boa.

Lembra-se do flagrante escolar quando você arremessava “pela primeira vez” uma bolinha de papel, justamente quando a inspetora de alunos adentrava a sala.

Foi pior!

Na minha primeira vez, era a diretora que vinha apenas dar um recado, mas aproveitou e levou-me para sua sala, para uma conversinha.

Meu maior desejo nessa hora era...

Pensando bem, paremos por aqui essa conversa de desejos.

Desejo dá muito contrapé... E todo cuidado é pouco nesse viés.

Por estas bandas, conheci um parceiro que conta da sapiência e cautela dos motoristas de caminhão. Sempre que retornam para suas casas após semanas de viagem, entram na cidade buzinando. Para evitar contrapés constrangedores. Afinal, reza a lenda que o artifício do “buzinaço” evita encontrar pela casa sapatos que não cabem em seus pés.

No caso dele não teve bom final sua aventura. Era o dono do sapato e não deu tempo de dar no pé.

E os contrapés desencontrados das primeiras paixões?

Do presente esquecido na data inesquecível?

Quantos contrapés!

Ah! Se eu tivesse memória melhor àquela época, evitaria ser pego em tantos. A vida não se fartou de me causar contrapés.

Daria para escrever um tratado, mas meu tempo é escasso.

O menor mal de meus sofrimentos era quando o goleiro do meu time era pego no contrapé do frango.

Por vezes, fui pego cochilando em pé sobre o serviço e o chefe chegava mais cedo.

Entre um contrapé e outro, sobrevivia e fazia planos.

Um dia, ao conferir meus exames, o doutor disse-me friamente: Um ano de vida!

Esse contrapé foi violento! Pegou a canela!

Eu tinha tantos planos para aposentadoria.

Vencido o choque, não me dei por vencido e fiz alguns planos para o que me sobraria de tempo. Viajar o que pudesse, comer e beber do melhor possível. Que se lixassem as dívidas e meus credores sempre me enchendo de contrafés de cobranças.

Neste último ano de vida iria me esbaldar.

Não há nada que não piore!

Devia ser dia do contrapé do piloto.O avião em que eu viajava caiu e ninguém sobreviveu.

Foi meu último contrapé.

Felizmente, hoje estou liberto desses contrapés.

Por tudo isso, daqui de onde estou, decidi enviar esta mensagem aos “vivos” daí:

Os contrapés são imortais e sempre vencem!

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Este texto faz parte do Exercício Criativo - No Contrapé

Saiba mais, conheça os outros textos:

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Pedro Galuchi
Enviado por Pedro Galuchi em 24/04/2012
Reeditado em 24/04/2012
Código do texto: T3630594
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