Encontro com Deus

Foi o que me disseram: que Deus passaria justamente nesta praça, exatamente às sete horas da manhã, de segunda feira, na primeira semana do mês seis.

Estou aqui religiosamente todos os dias e, já se passou a metade do ano, nada de Deus me aparecer, apenas alguns amigos de prosa e de truco. Venho sempre à praça principal, àquela do coreto com chafariz.

Chego todos os dias às seis, compro a gazeta do dia, leio os cordéis do mestre Gaio, enquanto espero Deus.

Lá pras sete e trinta, a vontade de tomar um cafezinho ou de ir ao banheiro aumentam a minha ansiedade. Então, tudo se torna crucial: o cafezinho na venda de comadre Águida, o carteado com a turma do professor Marco Túlio. É um olho no cordel, outro na alameda que divide o jardim da praça e, nada de Deus.

Às oito horas, já me doia as costas, meu estômago roncava e meu coração batia mais veloz e impaciente. Comi aqueles biscoitos que eu havia colocado no bolso do casacão de lã e, continuei ali, com um olho na gazeta outro nos corredores da praça, mas Deus não passou.

Então pensei: vai ver que ele desistiu, vai ver que ele já tenha passado, e não pude vê-lo, ou eu tenha me distraido com as histórias do mestre Gaio.

Penso que ele virá vestido de branco, porque branco é a roupa de quem é bom. Vai ver que ele passou vestido com uma outra cor, e ninguém pra me avisar. Vai ver que ele deve ter passado, no instante em que em que eu jogava farelo de biscoito aos pombos, onde eu deveria estar com a cabeça baixa.

Dizem que Deus é um homem muito bom e, só que tem fé, é quem poderá vê-lo. Então, posso vê-lo, tenho fé e sou um homem de bem.

Vai ver que ele pode está querendo me fazer uma surpresa, disfarçando em pipoqueiro, ou de jardineiro, ou de vendedor de algodão-doce.

Quem sabe ele já tenha passado, ou talvez nem saiba que eu precisava tanto vê-lo. Certamente se conhecêssemos um ao outro, não haveria esse desencontro.