A máquina que consertava erros

Em 1974 eu trabalhava em uma loja de importação e exportação de ferramentas ali na famosa Florêncio de Abreu, centro nervoso de São Paulo, onde existe uma enorme concentração de lojas do ramo de ferramentas, maquinários e acessórios de manutenção. Tudo que você possa imaginar de tranqueraiada, é ali na Rua Florêncio de Abreu que você encontra. Têm mais ou menos uns duzentos estabelecimentos onde se comercializam desde uma simples arruela até lanchas e iates.

Duas coisas me deixaram nervoso durante os três anos que trabalhei ali naquela loja.

Uma delas foi o vexame que o Brasil deu na Copa do Mundo de Futebol em 1974, sediada na Alemanha Ocidental.

Já sem Pelé e depois de ter tomado um verdadeiro vareio na semifinal contra a seleção Holandesa, a famosa laranja mecânica, o Brasil disputou o 3º e 4º lugar contra a inexpressiva seleção da Polônia. Um verdadeiro vexame, perdemos o jogo por 1x0 e tivemos que amargar um paupérrimo 4º lugar, deixando o Brasil inteiro roxo de raiva, inclusive eu.

Outra coisa que me deixou fulo da vida também e que hoje me recordo achando graça foi sobre uma matéria exibida pela TV Cultura. Eles mostraram um documentário americano sobre uma máquina de datilografia elétrica que, quando o datilógrafo errava alguma letra, ele apertava um botão na máquina, clicava sobre a letra que havia digitado errado e por incrível que pareça a letra errada sumia. O indivíduo continuava o seu texto tranquilamente sem se preocupar com borracha ou ter que refazer todo o trabalho novamente.

Nessa época eu trabalhava de notista/faturista nessa loja. Era terrível. Toda vez que você errava uma letra tinha que rasgar o documento e começar tudo de novo. Ou, dependendo do serviço, até dava para passar uma borracha. O único problema é que às vezes o documento era elaborado em quatro ou cinco vias e ai então tínhamos que apagar página por página. Às vezes em volta do datilógrafo se formava uma montoeira de farelo provocado pelo uso constante da borracha e os mais engraçadinhos perguntavam se o pobre infeliz estava comendo macarronada, relacionando aquele farelo com queijo ralado.

Nessa época nem sonhávamos com as maravilhas do computador, que viria acabar com todo esse sofrimento. E quando eu falei de uma máquina capaz de consertar o erro do datilografo e que mais tarde ficaríamos sabendo se tratar da famosa fita branca corretiva, ninguém acreditou naquilo. Para a época isso era algo que todos ali acharam impossível. Uma máquina que consertava o erro do datilografo? Isso não tinha possibilidade alguma de ser feito. Era inadimissível acreditar em algo como aquilo.

Foi uma tiração de sarro sem tamanho para cima de mim. E quanto mais eu tentava explicar qual era o processo que tornava aquilo possível, mais eles tiravam sarro da minha cara, o que me deixou remoendo de ódio por várias semanas.

Depois de alguns anos essa máquina chegou ao Brasil, porém já não trabalhava mais na mesma empresa e por esse motivo não tive como me vingar daquele pessoal.

Vejam bem, se naquele dia eu falei sobre algo que hoje faz parte de um museu qualquer e eles passaram quase um mês tirando sarro da minha cara, imaginem então se eu tivesse contado para eles as maravilhas dessa máquina fabulosa chamada computador. Com certeza teriam mandado me prender ou talvez tivessem me internado em algum manicônio por insanidade mental irreversível.