MEMÓRIA AFETIVA - GASTRONÔMICA

MEMÓRIA AFETIVA – GASTRONÔMICA

É incrível como alguns sabores nos remetem imediatamente a situações passadas.

Tais recordações podem, como todas, ser boas ou ruins.

Feijão pode me levar a tantas emoções passadas, desde a infância, quando tinha ciúmes de minha irmã que recebia seu prato com feijão coado (sem o caroço), um mimo da nossa mãe preta, D. Eurides, passando pelo período em que morei em Portugal e me surpreendi com a quantidade, diversidade e receitas de feijão que eles consomem, até os dias atuais, que apesar de precisar, quase não como mais.

Ostras só me lembram praia, eu criança com minha família em Guarapari (ES), meu pai chamava o vendedor e ele não mais saía de perto, pois suas ostras sempre acabavam na nossa barraca. Eu adoro ostras desde sempre.

Memória imediata tenho com abacaxi, pois me lembro imediatamente de uma amiga portuguesa, Fernanda, que só de lembrar do cheiro das nossas frutas ficava com a boca e os olhos rasos d’água.

Hoje, ao fazer um capputtino, me lembrei de um antigo namorado, J.J., que era muito chato com comidas. Além de não comer determinadas coisas como gorduras em geral, também sequer experimentava qualquer coisa que viesse da água, ou seja todo tipo de peixe, etc., nem pato ele comia.

O pior acho que era o leite, que deste ele não queria nem notícias. Nem amarrado, J. J. bebia um copo de leite.

Muito bem, J. J. foi fazer pós-graduação em Belo Horizonte, nas idas e vindas de lá, um dia ele chegou todo contente dizendo que lá nas minas gerais tinha um café muito bom com espuma, um tal de capputtino.

Imediatamente eu fui para a cozinha para fazer um capputtino para ele. Assim que peguei o leite ele ficou bravo. Não imaginava que capputtino era uma mistura com leite. Nunca mais tomou.

Outra foi o tal do caldo de mocotó, ele disse que adorava, mas como eu já sabia das suas neuras, por pura covardia expliquei o que era o mocotó, um dia, dentro do curral enlameado. Tchau mocotó!

Vocês vão pensar que o cara é retardado. Sinto muito desapontá-los, ele é professor universitário e autor de livros. Isso é a memória afetiva gastronômica dele. O que ele nunca tinha experimentado sem saber, comeu e gostou, mas o que ele já tinha implicância ou nojo, não, nem pensar.

O problema gastronómico entre nós ficou insustentável, a ponto de minha mãe ter sempre, na época, um pacote de macarrão instantâneo na despensa, mas não adiantou, sou curiosa, gulosa e gosto de cozinhar. Aí o peso da gastronomia falou mais alto e percebi que aquele relacionamento não era possível.

Minha família é muito ligada à cozinha, não temos restaurante, mas quase todos nós gostamos de nos aventurar no mundo do fogão.

Eis algumas memórias gastronómicas que me ocorrem agora:

Macarrão com pimenta – Tia Naná; farofa de ovos – Vozinha; Rabada – minha irmã Silvia; peixes e demais frutos do mar – meu irmão Fraga Neto; farofa de alho – minha cunhada Aparecida B.; torta capixaba, torta de bolinhos de bacalhau e doces caseiros – minha mãe; feijoada e cozido – meu pai; doces, balas e bombons – Tia Edith.

São tantas memórias que passaria o dia escrevendo, mas tenho certeza que vocês também têm suas memórias, que devem estar fazendo tumulto no paladar.

Cinthya Fraga
Enviado por Cinthya Fraga em 28/08/2012
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