TRUQUES
 
Comentei em uma de minhas últimas crônicas o fato de estar lendo o livro de Sara Bakewell, Como Viver, que é uma biografia do Filósofo Montaigne através de uma pergunta (Como Viver?) e vinte tentativas (bem sucedidas) de respostas.
Uma das respostas para essa pergunta é Recorra a pequenos truques.

Nesse capítulo descubro que Montaigne demonstrava desdém pelos filósofos acadêmicos, considerando-os pedantes e portadores de idéias abstratas. Era fascinado por aqueles que exploravam questões cotidianas. Dentre essas escolas pragmáticas encontramos o estoicismo, o epicurismo e o ceticismo – tendências de pensamento que buscavam a mesma coisa: a felicidade do ser humano.

Na minha cabeça esses pensadores hoje seriam conhecidos como “escritores de auto-ajuda” e certamente venderiam muitos livros. Assim como Montesquieu, que passou a vida buscando isso e registrando suas conclusões no magnífico livro Os Ensaios, que não passa de um livro que nos mostra como viver melhor, mas escrito com seriedade.

Montaigne considerava que viver adequadamente é a grande e gloriosa obra-prima da vida humana, mesmo que para isso tivesse que usar truques (imaginação) para afastar as coisas adversas de sua vida. A chave para conseguir sucesso com esses truques embora simples é difícil de praticar – controle das emoções e observação constante de si próprio, tanto para as atitudes externas quanto as internas. Em palavras mais atuais: autoconhecimento.

Lendo e refletindo descobri um truque que uso para não desistir dos meus sonhos que exigem a posse de dinheiro. Antigamente eu sonhava em ganhar na Mega Sena, mas sem jogar. Então mudei de tática - Em frente a minha Fábrica de Pães tem uma Casa Lotérica. Faço a aposta mínima, R$2,00 por jogo, mas faço isso com a teimosinha – jogo os mesmos números para 8 sorteios (R$ 16,00) e vou acompanhando o valor do prêmio e sonho de acordo com ele. (Desde que comecei a jogar o prêmio tem variado de R$ 2 milhões a R$34 milhões). Acho até que é um bom truque, pois à medida que alguém ganha e tudo volta à estaca zero vou exercendo a humildade e, quando ganhar, não serei pega de surpresa pois saberei direitinho o que fazer com o dinheiro.

Quem não tem medo de envelhecer, de morrer, de perder um ente querido, de ficar pobre, na miséria? Nossos filósofos, incluindo Montaigne também tinham e precisavam encontrar um jeito para acalmar o coração. A maioria das pessoas busca isso na Fé e se apossa de Deus como se Ele estivesse a sua disposição. A maioria tem uma Religião e procura acreditar nela mesmo quando a razão mostre que ali nada pode haver de verdadeiro. Eu não tenho (mais) uma religião, mas o truque que usei é ter a certeza de que Deus existe e que há um propósito para tudo na vida. Assim vivo bem tentando ser melhor do que sou a cada dia, na certeza de que a minha vida não começou nem vai acabar aqui. E mais, não tenho medo de morrer, porque se o que acredito for verdadeiro, vou viver melhor ainda e se não for, certamente nem ficarei sabendo. Já diz o ditado, o que os olhos não vêem o coração não sente. E nem tenho medo de envelhecer porque me mantenho atualizada com a vida da mesma forma que me mantinha quando jovem. Com uma diferença – hoje sou uma mulher madura capaz de compreender melhor a mim e ao outro.

Quanto aos livros de auto-ajuda não sou contra. Cumprem o papel de nos ajudar a viver melhor. Quase todo mundo lê esse tipo de livro, mas muita gente se envergonha, como se fosse uma subliteratura. Nada tenho contra, já li muito. O que me aborrece é a picaretagem: alguém encontra uma boa ideia, consegue editar o livro, é bem vendido e aí começa a escrever coisas repetitivas sabendo que já fez o nome e agora pode escrever o que quiser que vai ser vendido.  Mas certamente existem livros de auto-ajuda interessantíssimos: vou citar só dois, bem conhecidos: O Pequeno Príncipe e Os Ensaios.