Aquelas tardes cinzas

Nas badaladas cinzas das tardes de inverno vê – se pela janela duas crianças brincando, mesmo com o vento gelado que comprime cada um dentro dos casacos e da fortaleza residencial elas continuam ali de pés descalços, calças curtas rindo e sorrindo. Ficava os observando por horas a fio daquela nebulosa janela com alpendre, o ar daquelas crianças era diferente de tudo que já havia visto, não importava quão frio estivesse fazendo elas sempre estariam ali, aproveitando a felicidade que a infância impõe.

Mesmo nas tardes chuvosas daquele inverno tenebroso que fazia qualquer um se sentir morando na Sibéria, as crianças saiam de suas casas para poder aproveitar o saboroso banho gelado de inverno e eu dentro de minha sala quentinha, no aconchego de meus cobertores pensava: será que eles não ficam doentes nunca? E os pais deles não se preocupam com o que possa acontecer a eles? Que tipo de pais relapsos devem ser meu Deus, são apenas duas crianças que podem contrair uma pneumonia ou algo do tipo? Mais não são meus filhos que tenho eu que me meter com isto? Deixe-os lá com o vento gelado e eu fico aqui a observar.

Os dias seguiram e a rotina das crianças era a mesma todas as tardes, e por conseguinte a minha também, algo me fazia bem ao olhar a felicidade com que elas viviam a infância mesmo nos dias frios em que sozinhas enfrentavam as ruas para jogar bola e demais brincadeiras que encantavam a jovialidade com que viviam. A medida que o calor ia colorindo o céu com tons dourados e os pássaros começavam aos poucos a aparecer a intensidade daquelas crianças fora diminuindo e eu que passei o inverno inteiro de expectador das traquinagens fui achando aquilo estranho e as indagações começavam a perturbar meu inconsciente.

Os dias seguintes foram de ruas vazias, sem vida, mesmo com o viço e o perfume da primavera tudo estava sem graça, cinzas eu diria e aquelas crianças onde andariam? Por que passaram o longo inverno brincando no frio e agora com o calor e a beleza de uma nova estação eles simplesmente desapareceram? Aos poucos a rua foi se enchendo de crianças, só que nenhuma delas tinha o mesmo brilho e a vivacidade dos garotos, não encontrava graça em observar. Um dia já cansado de esperar que eles saíssem as ruas para brincar fui até a casa deles, chegando lá os encontrei estudando e brincando no quintal da sua casa mesmo, o interessante é que a felicidade dos meninos era a mesma dos dias tenebrosos do inverno. Perguntando a eles sobre não terem mais ido brincar na rua e um deles sabiamente me respondeu: Nos dias frios ninguém tem coragem de brincar lá fora e é nesses dias que a vida fica mais prazerosa, mais vivida, fica mais vida, as brincadeiras são mais engraçadas e com mais cor, agora nos dias quentes todos saem para enfrentar a vida e brincar e acabam tumultuando tudo, confundindo as coisas e achando que sabem viver, sai dali sem resposta alguma para eles e ruminando caminhei até em casa pensando na lição que havia aprendido com aquelas crianças que na simplicidade em que viviam me mostraram que existem 3 tipos de pessoas: As como eu que ficava me divertindo e observando a vida dos outros passar, as que preferiam enfrentar a vida nos momentos bons e nos ruins se escondiam dela e aquelas que a encaravam de frente quando ninguém mais acreditava que ia dar certo.

Moreira Neto
Enviado por Moreira Neto em 05/11/2012
Reeditado em 17/05/2019
Código do texto: T3969670
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