Um Presente Especial


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Se temos de esperar, que seja para colher a semente boa que lançamos hoje no solo da vida. Se for para semear, então que seja para produzir milhões de sorrisos, de solidariedade e amizade.
                                                        Cora Coralina

 


     Pessoas do meu convívio sabem o quanto gosto de presentear, mas sabem também o quanto gosto, o quanto dou valor aos presentes que ganho, mais ainda os inusitados, os inesperados, aqueles cujo sentido e significado guardo em minh' alma, para sempre.
     Nesse período natalino em que, mais que lembrar o que de fato celebramos, o consumo desenfreado é estimulado e a troca de presentes parece mais obrigação que gentileza e carinho, o ato, o gesto de presentear pode e deve ter um novo sentido.
     Não faz muito tempo, vivi uma situação bem interessante relacionada a presentes.  Aproximava-se o natal e estava realizando um trabalho numa capital daqui do nordeste. No segundo dia, noite livre e boa parte do grupo concordou em passear na orla, bem perto do hotel onde estávamos, animados por conhecer  o palco de shows e de folguedos típicos.
     Encantei-me com as apresentações em especial, de um grupo de senhoras todas caracterizadas como “Maria Bonitas”, dançando com uma alegria contagiante. Fotografei várias danças e, ao término, fui atrás do palco cumprimentá-las.Apresentei-me e todas muito simpáticas, explicaram que eram um grupo da periferia da capital e que adoravam ser convidadas para se apresentar em solenidades e em projetos daquele tipo.
     
Ao me despedir, uma  delas me presenteou com uma linda boneca almofada, “ -Tome minha filha, sou eu quem faço. Leve para enfeitar seu quarto!” Me emocionei com o gesto daquela senhora que não me conhecia, mas me olhava nos olhos com tanto carinho e bondade! Vi ali minha avó que tanto fazia para me agradar!Vi ali um anjo me falando de amor em um gesto singelo.
 
     Agradeci, dei-lhe um abraço, desejei boa sorte e ela me disse “Vai com Deus” e eu saí flutuando! Quando alguém me perguntou, espantado talvez com o gesto de delicadeza de uma “estranha” para comigo, porque ela havia me dado aquele presente eu respondi: “ - Ela gostou de mim”!
     De volta para o hotel chovia um pouco e paramos numa barraca. Pedimos café e tapioca e a senhora que nos atendeu nos acomodou em um cantinho sem muito vento. Quando chegou nosso pedido percebi que  tudo era descartável mas acomodado em bonitos cestinhos e porta copos feitos de jornal reciclado.Elogiei o bom gosto puxando conversa e a senhora simpática e solícita contou que também era artesã e doceira e ficamos ali, feito duas comadres, trocando receitas.
     Quando a chuva passou, pagamos a conta, agradecemos e já íamos saindo quando ela me chamou, me presenteou com um conjunto de cestinho e porta-copo e desejou que voltássemos outras vezes.
     Voltei com os mimos recebidos para o hotel ouvindo as brincadeiras do grupo. “Edna, me passa a fórmula”, brincavam, mas todos sabiam que esse meu jeito de me aproximar das pessoas, de tratar como gosto de ser tratada era/é  a tal "fórmula", embora a mesma esteja cada vez mais em desuso, nesse mundinho onde impera a desconfiança, o desamor, a falta de delicadeza.
     Na semana que antecedeu o natal daquele ano apareceu em minha porta uma senhora já idosa vendendo pisos e panos de prato.Nem precisava mas resolvi comprar alguns, pois sei da luta dos idosos para sobreviver com suas aposentadorias. Do lado dela sua neta, uma linda menina aparentando oito anos ou menos, de olhos negros e tristes me fez lembrar a boneca, que enfeitava minha cama.Pedi que esperassem, fui buscá-la e entreguei para a menina dizendo que tinha sido presente de uma pessoa especial mas agora era dela.
     Um dos melhores presentes daquele meu natal foi o brilho, a alegria e o encantamento que vi nos olhos daquela menina.