Baal

Baal

Contradição é o meu nome.

Eu sou um homem que aspira ao nada, desejando ser alguma coisa.

Imito para destruir e, talvez, não ser como os outros.

Achava que estava no controle de tudo:

das pessoas, dos meus passos, dos meus negócios, do meu ser.

Eu falava e as ações dos outros se materializavam.

Aí veio a porra do acaso e me deu na cara:

- um ovo sobre a mesa e o martelo ao lado.

Sempre me refugiei nas palavras,

mas não foram o bastante, não deram conta do céu, do purgatório,

do inferno que agora reina em mim.

Desejo morrer como um cão: rastejando-me pelo chão,

carente da solidariedade e calor humano.

(Tadinho de mim, tenham pena desse pobre coitado!)

Porém isso deve ser feito com maestria: contraindo o abdômen,

botando pra fora aquela pasta verde

- mistura de capim e cuspe.

Ora, não me vem com nojo!

Dêem-me algo para beber, tô com a boca amarga.

Foi esse caralho de pitu.

Sou um deus decaído.

Tenho por trono a privada: lugar único onde se pode ficar plenamente sozinho;

misturar pensamentos, dores e merda.

Minha vida é a parábola de um rebelde solitário que ao mesmo tempo é poeta.

Anti-herói! daqueles fudidos mesmo: sem máscara, sem símbolos no peito,

sem essas porras todas de super-herói.

Só o mal-caratismo é o bastante.

Tenho o semblante de um cadáver vivo.

Minha arma é deboche cínico e feroz.

É... pode ser: “o humor é o mais inocente dos assassinos”.

Porque, mesmo mergulhado na miséria e excrementos da vida, consigo ainda rir.

Tentando me matar aos poucos, um dia após o outro.

“Naquele dia ouviu-se trovoadas e relâmpagos no céu.

Descontente com a humanidade,

Baal ressoava seu canto fúnebre aos quatro cantos da Terra.

Todos temeram a ira do deus primitivo

Que abria as portas do inferno sobre os homens de ‘boa fé’”.

(Picalanicenses, livro escrito em couro de pica dos ascetas do Templo Rolaka)

Fabiano Vale
Enviado por Fabiano Vale em 05/08/2005
Código do texto: T40526