Borboletas amarelas




 
            Acho que sou meio parecido com aquele amigo meu, que nos anos 70, foi à Paris pela primeira vez e ficou três dias dentro de um quarto de hotel, apenas aguardando o dia de retornar para o Rio de Janeiro.  Ele só queria chegar a Paris e voltar.  Não me perguntem o porquê deste inusitado comportamento, mas o fato é que ele fez isso e não tive a coragem de perguntar o motivo dessa estranha atitude.
            Talvez ele tenha sabido que Paris é adorável, mas sem os franceses !  Claro, isso é piada e não tenho nada contra os queridos franceses, pelo contrário, até tenho uma vaga sensação, acreditando na reencarnação, de que fui francês na minha última vida, já que ando nestes últimos tempos bastante irritado e adoro dizer “Merde, merde”.
             Mas o que estou querendo contar  é que fiquei incomunicável durante 05 dias, sem por os pés na rua e, principalmente sem atender a porta e o telefone, na casa de meus pais, que haviam viajado.
            Tive que fugir da namorada da época e invadia-me uma melancolia pelas minhas constantes brigas com a namoradinha. O pior é que ela me queria assim mesmo.
            Mas resolvi apanhar um fôlego e levei para o apartamento dos “velhos” o grosso livro “Cem Anos de Solidão”, do grande Gabriel Garcia Marquez. Foram cinco dias,  lendo sem parar,  e maravilhado com a estória fantástica do escritor colombiano, narrando sobre  a cidade de Macondo e as sete gerações da família Buendía.
            Não teria lido esse livro, não fosse a minha decisão de me enfurnar no apartamento dos meus pais, em Botafogo, no Rio.
            Vejam meus amigos que o realismo fantástico não é tão absurdo assim. Dez anos antes desse episódio, tive que ir a São Paulo. A missão era pegar uma antiga escritura em Barueri. Cheguei sexta-feira no final da tarde e teria que esperar até segunda-feira.
            É inacreditável o que vou contar: fiquei na cama, praticamente dormindo sem parar, o fim de semana. Acordei às duas da tarde e quando saí do hotel encontrei São Paulo às escuras, em pleno dia.  Tinha havido um eclipse total do sol e os paulistanos estavam espantadíssimos. Ignorando o eclipse,  peguei um táxi na São João ou Ipiranga, não me lembro mais,  e fui para
Barueri. De lá, direto para o aeroporto, com saudades da ensolarada cidade do Rio de Janeiro.
            Posso afirmar que o realismo fantástico ou mágico existe! E como na estória do Gabriel Garcia,  onde o absurdo é regra,  sou constantemente perseguido por borboletas amarelas.
            Às vezes penso que elas querem me dizer alguma coisa, me aconselharem. Quem sabe, consternadas,  não querem que eu me esconda tanto, que eu saia da minha escuridão e aprenda de uma vez por todas que está tudo aí pra gente curtir.
            Afinal, ainda há vida, seja em Paris, São Paulo ou Rio de Janeiro. E as borboletas ainda me segredaram: “Volte a ser menino e mergulha nas ondas da praia do Leme, lá onde tudo começou pra você! Volte a ser o moleque da rua Santo Amaro, pra lidar com a molecagem da vida.  Faça uma reverência à Iemanjá e deixe sua alma  cantar: - Oxalá, meu pai, tem pena de nós tem dó, a volta do mundo é grande, seu poder inda é maior...
 



               Nota:  Dia 19 de janeiro completo três anos de Recanto das Letras. É pouco tempo, mas parece uma existência... Cumprimento meus amigos e amigas pelo saudável convívio. Gilberto