O PARTO

Sempre que posso nos finais de semana eu vou para um pequeno sitio que tenho no interior de S.Paulo. Uma cidade pacata, de gente simples, homens do campo, mulheres antigas de conceitos religiosos.

Sábado passado eu estava plantando grama na entrada da porteira. Boné, camiseta rasgada, e short sujo de lama. A cada pedaço de grama plantado, jogávamos agua eu e meu caseiro e pisoteávamos a grama e enchíamos o nosso corpo de lama, parecia mais uma brincadeira de criança, do que um trabalho braçal.

De repente, um rapaz aproximou-se de bicicleta e parou quase ao meu lado.

--- boas tardes.

Respondi

--- boa tarde, procura alguém?

--- tô atrás do doutor, ouvi disser que ele cuida de mulher prenha, e a minha esta precisando de ajuda.

Olhei os meus trajes, e fiquei com vergonha de dizer quem eu era.

--- posso saber o que esta acontecendo, o doutor esta trabalhando, acha que ele não vai poder atendê-lo. – meu caseiro olhou de soslaio, mas não disse nada, escutava o dialogo.

--- mas eu preciso falar com ele mesmo, como eu disse minha mulher esta prenha e o médico da cidade disse que ela tem que tirar o nenê pelo umbigo.

Eu quis rir da ingenuidade do sitiante, mas não o fiz. Com certeza ele queria dizer uma cesárea.

--- senhor, se ele for atendê-lo e vai precisar de algum documento da sua esposa, carteira de gestante, ou algum ultrassom.

--- esse negócio que o amigo disse por último eu não sei, mas a carteira do médico esta aqui.

Assim dizendo, ele remexeu em uma sacola a tiracolo e retirou a carteirinha de gestante.

Eu estava com a mão cheia de lama, e esfreguei no short já sujo. Peguei um lápis que eu trazia sempre atrás da orelha, para anotar as coisas que eu achava que deveria ser feita durante a minha estada no final de semana no sitio.

Fiz as contas pelo primeiro ultrassom, ela completaria 39 semanas no dia 15.02.

Peguei o resultado anotado do ultimo ultrassom que o médico havia pedido para confirmar a posição do feto, o resultado dizia 37 semanas apresentação pélvica.

Devolvi o documento para o amigo e disse.

--- o seu filho ou filha esta pélvico, o que tem indicação de cesárea, o senhor pode levar a sua esposa para a maternidade de Pindamonhangaba no dia 15.02, às oito horas da manha em jejum, e eu vou fazer a cesárea.

Foi então que o homem olhou um tanto incrédulo para mim.

--- perdão.... O senhor é o doutor, assim todo lambuzado.

--- sim... Eu sou

--- perdão... O medico de lagoinha disse que o menino esta sentado.

Ri suavemente.

--- sentado e pélvico é a mesma coisa.

--- doutor, eu não tenho dinheiro, mas tenho uma porcada, e uma galinhada de fazer inveja na vizinhança, o senhor pode escolher o que quiser.

Sorri.

---- não precisa pagar a indicação de cesárea, venha entre que eu preciso fazer um encaminhamento.

Entramos, peguei o receituário e fiz o encaminhamento, caminhamos novamente em direção à porteira.

--- doutor, por favor, eu preciso pagar alguma coisa. O que o senhor gosta de comer.

--- paçoca e requeijão no prato.

Ele pareceu ficar eufórico.

--- pronto esta resolvido, assim que o filhão nascer eu trago uma paçoqueira e o requeijão, a mulher vai caprichar tenho certeza.

--- não precisa.

--- faço questão.

--- tudo bem, não esqueça dia 15.02 às 8 horas da manhã em jejum na santa casa de Pindamonhangaba.

O sitiante subiu em sua bicicleta. Tinha um sorriso enorme no rosto.

Eu voltei a plantar grama.

Ton Bralca
Enviado por Ton Bralca em 15/02/2013
Código do texto: T4141525
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