Futebol e os heróis que não morrem de overdose

Penso que não existe nada mais idiossincrático que o velho esporte bretão. Milhares de visões sobre as inúmeras valências que ocorrem no “campo”. Razão e emoção disputando os valiosos centímetros relvados. O grito e o apito, o carrinho e o aperto de mão. A fúria risonha e a felicidade chorosa. A biosfera mais complexa do planeta – provavelmente a mais hostil. A imensidão divergente, a multidão de conflitos que comprova a noção de infinito. E quando as pesquisas cospem os resultados, reinventamos as máximas: “não pensamos, logo existimos”, que se dane o Sócrates sem chuteiras, pois eu “só sei, que tudo sei”.

Não por outra razão, meu conceito de ídolo não se abriga nos cantos aconchegantes dos ângulos retos. Não, de modo algum. Nasce do vórtice de loucura – ou sanidade – do meu espaço curvo (sem Eddington para comprovar). Onde o “Imperador” não serve de engraxate. Onde os fracos não tem vez, o que, em hipótese alguma, quer dizer que a imbecilidade é a mola mestra.

Na minha não tão humilde concepção: técnica e tática valem tanto quanto caráter e cavalheirismo. Por isso, no meu time a “Enciclopédia” joga e o “anjo”, de pernas tortas, fica no banco. Afinal, mudanças bruscas de direção fora das quatro linhas não podem ser encaradas como “a tal” irreverência irresponsável. No universo onde me faço Dele, Maradona estará em Elba, eternamente exilado. Riscado de todas as listas, com permissão de dar algumas voltas de bicicleta nos finais de semana. É que na minha realidade todo “Lance” tem consequências.

No meu meio-campo, Felipe nunca vai ser Juninho, nem Diguinho vai ser Didi – pra falar a verdade, não tem Sheik que chegue perto do Príncipe Etíope! Um ídolo não se faz “solamente” de habilidade, as várzeas e os rincões estão ai para confirmar. O herói não nasce, ascende. Júnior Baiano nem em reencarnação será Juan. Todos os dias uma nova joia da base é inventada, mas poucos se lembram do inventivo Diamante Negro.

Minha sandice está no metafutebol, além do mau e do mal, um lugar no qual cotoveladas ainda são abominadas e tesouras voadoras são mais repreendidas do que cortes de cabelo. Local onde seriedade não se confunde com violência - um habitat pouco propício para os Dungas e Scolaris. Uma miragem onde arqueiros não sabem usar flechas, artilheiros andam desarmados, matadores só recebem amor e capitães orientam, ao invés de dar ordens cretinas – cobrando cicatrizes como generais cobravam escalpos. O refúgio que um dia teve em suas margens os pés orgulhosos e malcriados de Heleno e que agora ostentam o holandês genial. O ícone forjado delicadamente no ébano. A resistência solitária de uma constelação apátrida. O último bastião de uma Era que ainda não foi plena. O homem que não quis colecionar cartões, tampouco, respeitar meridianos.

Por essa e por outras que sempre digo: Arigatô, Zico!

RSollberg
Enviado por RSollberg em 05/03/2013
Reeditado em 05/03/2013
Código do texto: T4173365
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