Diálogo dos muribundos

Em plena juventude, todo mutilado e maltrapilho ele caminha aos prantos em direção ao primo rico.

- Preciso me aconselhar, pois não quero partir sozinho. Minhas filhas mais novas, as nascentes, se casaram com as moto-serra, e estão todas quase despidas, pois foram todas maltratadas e não conseguem mais respirar. Minhas filhas mais velhas, as lagoas, se casaram com as grandes dragas e com os modernos tratores de grandes pneus que rasgaram suas roupas em grandes vazantes. Seus úteros secaram e seus filhos morreram.

O rio Jacaré ao avistar o seu primo rico, não acreditou no que viu, pois pensou que ia ser recebido com festas e uma orquestra em sua homenagem iria tocar. Pensou também que seria recebido com uma grande chuva para refrescar, mas viu que seus lábios secaram e seus olhos cegaram e quase não conseguia mais enxergar. E se seguisse seu curso, com o mesmo discurso, os dois iriam naufragar.

O rio São Francisco em prantos o informou:

- Minhas filhas estão também todas mal-casadas. O sol tão bondoso se transformou em inimigo raivoso e perverso que irá me destruir. Minhas filhas, as matas ciliares, foram desobedientes e partiram daqui contentes na carroceria de um caminhão. Todas se casaram com motos-serra e acabaram num forno de carvão, hoje são todas.